Em meio a debates sobre desmatamento e aumento da desigualdade social, relatório brasileiro evidencia em que medida 60 das maiores marcas de moda que operam no país divulgam publicamente suas políticas, práticas e resultados socioambientais
Com o objetivo de acelerar mudanças profundas na indústria da moda, o Instituto Fashion Revolution Brasil realiza, anualmente, o Índice de Transparência da Moda Brasil (ITMB). A 5a edição foi lançada nesta terça-feira (29), na sede da Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecção (Abit), em São Paulo (SP), revelando o nível da divulgação pública de 60 grandes marcas e varejistas do mercado brasileiro. O relatório analisa dados sobre suas políticas, práticas e impactos sociais e ambientais ao longo de toda a cadeia de valor, abarcando mais de 200 indicadores que cobrem tópicos relacionados à práticas de compra, salário justo para viver, igualdade de gênero e racial, circularidade, clima e biodiversidade, rastreabilidade da cadeia de fornecimento, iniciativas de governança, entre outros.
Transparência não deve ser confundida com sustentabilidade, mas sem ela será impossível alcançar uma indústria da moda mais sustentável, responsável e justa; portanto, a transparência se mostra como uma ferramenta de mudança e não como o objetivo final. A fim de alcançar uma abordagem sistêmica, o ITMB é dividido em cinco seções, sendo elas políticas e compromissos; governança; rastreabilidade; conhecer, comunicar e resolver e tópicos em destaque.
“Justiça social e justiça climática estão intrinsecamente ligadas. A moda, como uma das grandes indústrias do mundo, deve operar de forma mais justa e transparente, proporcionando um meio de vida digno para seus trabalhadores e contribuindo para a regeneração da Natureza” afirma Isabella Luglio, coordenadora do projeto e a frente da equipe educacional da organização.
Em um ano que o desmatamento alcançou números recordes e a urgência climática ocupa mais espaço no setor, os dados apresentados no relatório são desanimadores. Apesar da crescente perda da biodiversidade brasileira, nenhuma das 60 maiores marcas e varejistas analisadas divulgam publicamente compromissos mensuráveis e com prazo determinado para desmatamento zero. Se posicionar e agir contra o desmatamento deveria ser crucial e urgente para marcas que operam no Brasil, já que os índices dessa prática aumentaram vertiginosamente e já impactam todos os biomas nacionais.
A rastreabilidade é um grande desafio para a cadeia produtiva global, porém, é o elo crucial capaz de garantir dignidade na vida dos trabalhadores do setor. No relatório deste ano, 67% das empresas analisadas não divulgaram nenhuma informação sobre suas listas de fornecedores. Essa seção foi a que teve maior queda em em relação à média geral observada no ano passado: de 21% em 2021 para 18% em 2022. Vale ressaltar que em ano de copa do mundo, diversas marcas de esporte não apresentam bom desempenho, reforçando que a transparência na moda precisa ser pautada também fora do setor.
Dentre as empresas pesquisadas, a pontuação média foi de 17%, um ponto percentual a menos do que no ano anterior. As maiores pontuadoras foram: C&A (73%), Malwee (68%), Havaianas (57%), Renner (57%) e Youcom (57%). A maior parte das marcas está concentrada na faixa de 0-10% e, entre elas, 22 zeraram a pontuação: Besni, Brooksfield, Caedu, Carmen Steffens, Cia. Marítima, Colcci, Di Santinni, Fórum, Havan, Klin, Kyly, Leader, Lojas Avenida, Lojas Pompéia, Marisol, Moleca, Netshoes, Nike, Penalty, Sawary, TNG e Trifil.
A divulgação pública de informações confiáveis, abrangentes e comparáveis sobre as cadeias de fornecimento da moda permite que investidores, legisladores, jornalistas, ONGs, sindicatos, trabalhadores e seus representantes cobrem uma prestação de contas por parte de marcas e varejistas. Essa transparência possibilita que tais atores possam examinar o que as empresas alegam praticar em prol da garantia dos direitos humanos e da proteção ao meio ambiente, além de responsabilizá-las por suas políticas e práticas. Possibilita, também, a colaboração entre atores para cessar, mitigar, prevenir e remediar abusos ambientais e de direitos humanos e o compartilhamento de estratégias e melhores práticas sobre essas questões.
A transparência por si só não resolverá todos os problemas complexos e profundamente enraizados da indústria da moda, mas significa uma linha de base importante, sem a qual não poderemos avançar significativamente em direção a melhorias reais. Ao jogar luz sobre os lugares e condições em que nossas roupas estão sendo feitas, é possível resolver os problemas de forma mais rápida e colaborativa. E por isso transparência é tão importante.
ÍNDICE DE TRANSPARÊNCIA DA MODA BRASIL 2022
O Índice de Transparência da Moda Brasil 2022 foi elaborado pelo Fashion Revolution CIC e Instituto Fashion Revolution Brasil, contou com o apoio financeiro da Laudes Foundation e da parceria técnica da ABC Associados, consultoria especializada em metodologias para análises do desempenho e perfil de empresas no campo da sustentabilidade empresarial.
O ITMB 2022 pode ser acessado e baixado gratuitamente aqui.