Por Fernando Valente Pimntel*
A derrubada do veto presidencial à prorrogação da desoneração da folha de pagamento, que expira no final deste ano, é medida fundamental e indispensável, pois atende à prioridade máxima da economia brasileira neste momento, que é preservar e criar empregos. A perda de postos de trabalho, já acentuada na crise da qual estávamos saindo antes da Covid-19, agravou-se em decorrência da pandemia e poderá tornar-se ainda mais intensa se forem agregados mais custos trabalhistas às empresas dos 17 setores de atividade afetados, que são geradores de mão de obra intensiva.
A previsão para a taxa de desemprego na presente conjuntura já está batendo em 17%, algo sem precedentes em nosso país. Sem a desoneração, será maior, com efeitos em cascata negativos e reflexos sociais danosos, queda ainda mais aguda do consumo e aumento da demanda por auxílio emergencial/Renda Cidadã e de outros mecanismos de socorro do Estado, como o salário-desemprego. O pior é que isso viria junto com a redução já em curso do auxílio emergencial.
Assim, é premente a vigência, por mais um ano, da Lei 12.546/2011, prevista no Projeto de Conversão da Medida Provisória 236/2020. Cabe ressaltar que, segundo eminentes juristas e especialistas no tema, a medida não fere a Lei de Responsabilidade Fiscal e a Constituição.
Por outro lado, é preciso contextualizar o argumento do governo de que a renúncia fiscal relativa à desoneração da folha dos 17 setores é de R$ 10 bilhões. Aliás, mesmo assim a relação custo-benefício quanto à preservação de empregos seria altamente favorável. Afinal, não podemos, em hipótese alguma, renunciar à prerrogativa de inclusão social pelo trabalho de milhões de brasileiros. Pode parecer, numa leitura rasa da questão e na retórica de defesa ao veto, que as empresas nada estão pagando. Assim, é importante esclarecer: na contribuição convencional, recolhem-se 20% sobre os salários para o INSS; com a alternativa em vigor, o valor pago é determinado por um percentual sobre a receita bruta, que varia de 1% a 4,5%, de acordo com o setor. Assim, receita significativa continua sendo destinada à previdência.
Deve-se considerar, ainda, que a manutenção de milhares de empregos é um fato importante para a receita da previdência. Cada emprego perdido significa uma contribuição a menos. Ou seja, esse cálculo também precisa ser considerado na equação da alegada renúncia fiscal.
Também cabe lembrar que o governo cobra adicional de 1% a título de Cofins-Importação dos produtos dos 17 setores incluídos na desoneração. Estima-se que isso abata em R$ 3 bilhões a dita renúncia fiscal. No caso específico da indústria têxtil e de confecção, tal cobrança adicional representa estimativamente R$ 200 milhões, praticamente neutralizando os benefícios da desoneração da folha, que é de R$ 270 milhões anuais para o setor.
Manter empregos com carteira assinada no Brasil é mais oneroso do que em grande parte dos países. Os custos são o dobro, por exemplo, do que se verifica na média das nações integrantes da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico). São ônus contundentes contra nossa competitividade. Mais do que isso, porém, serão um fator incontornável de desemprego e crise social, dificultando a emersão da economia brasileira da mais grave crise enfrentada pela humanidade em um século.
Portanto, é crucial manter a desoneração em 2021, simultaneamente à bem-vinda reforma tributária, na qual deverá, sim, ser equacionado todo o arcabouço das contribuições da sociedade à manutenção de um Estado mais racional, menos oneroso e mais eficiente no cumprimento de sua missão constitucional. Entre a renúncia fiscal e o agravamento do quadro social, não há dúvida quanto às opções que se colocam hoje diante dos brasileiros.
*Fernando Valente Pimentel é o presidente da Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecção (Abit).