Por Fernando Valente Pimentel*
Alguns graves exemplos da história, como a varíola, gripe espanhola e as depressões de 1929 e 2008, evidenciam a capacidade de superação do ser humano, alimentando a certeza de que a civilização também vencerá a Covid-19 e seus duros efeitos para as pessoas, a sociedade e a economia. Nesse contexto, o Brasil tem demonstrado resiliência, não só ante os problemas do mundo, como dos próprios obstáculos que cria, provocados pelas más escolhas que fizemos nas últimas quatro décadas. Estas adversidades, aliás, nos colocam em desvantagem no contexto global, limitam a exploração de todo o nosso potencial e reduzem nossa competitividade.
Solucionar as questões estruturais, porém, é uma agenda a ser retomada e cumprida com eficácia após vencermos a presente pandemia, que, além dos prioritários protocolos relativos à saúde, exige a mobilização de todos numa estratégia de guerra para manter as pessoas saudáveis e a economia ativa. Tal desafio requer a união de esforços, sinergia e empenho máximo dos Três Poderes, entidades de classe, empresas e trabalhadores. É hora de coesão, humildade, desprendimento e foco total na preservação da vida. Isso também implica prover alimento, remédios, bens de primeira necessidade e os produtos necessários ao enfrentamento da Covid-19! Não é o momento de dividir, mas de somar competências para multiplicar esforços e resultados!
Ação crucial nesta conjuntura crítica – além das medidas já anunciadas pelo governo no tocante aos contratos de trabalho, apoio às micro e pequenas empresas, financiamentos e remuneração dos informais – é um pacto pela produção e o emprego. Indústria e varejo precisam unir-se para fabricar no Brasil tudo o que pudermos, mitigando parte das perdas provocadas pelo novo coronavírus. Se tivermos sucesso nessa iniciativa, solucionaremos dois problemas ao mesmo tempo: a escalada do desemprego, fechamento de empresas e o sofrimento da população; e o suprimento de produtos importantes para o combate à enfermidade, como máscaras cirúrgicas e de uso pessoal, vestimentas específicas para profissionais da saúde, aventais, abrigos, lençóis, testes clínicos e respiradores, dentre outros itens, que já são objetos de disputa comerciais e até mesmo de tensões diplomáticas entre alguns países.
No contexto de todo esse cenário, a indústria têxtil e de confecção está se reposicionando no que é possível, para atender às demandas urgentes. Fábricas já se adequaram para produzir itens com alta demanda neste momento, como os citados acima. Tal mobilização é importante pelo seu aspecto humanitário e solidário, pois o setor tem impacto em vários outros segmentos, emprega 1,5 milhão de pessoas diretamente e pode ser um importante pilar para a recuperação econômica pós-pandemia.
Trata-se, aqui, de um exemplo da capacidade de mobilização de toda a indústria de transformação frente a uma emergência. O parque manufatureiro segue com estrutura organizada, a despeito da perda precoce de sua participação relativa no PIB nas últimas décadas. Por isso, ao lado do varejo e dos distribuidores, tem como prover o que a sociedade precisa. Tal mobilização é crucial para o enfrentamento da Covid-19 e para preservar empregos e empresas, contribuindo para que nosso país atravesse com menos danos um dos mais graves episódios de toda a História!
A pandemia, por outro lado, escancara uma questão crucial: a importância de o Brasil ter uma indústria forte, tecnologicamente avançada, capaz de gerar empregos em grande escala e de qualidade, contribuindo para a elevação do patamar nacional de renda. Também mostra o significado de um parque manufatureiro que reduza a dependência tecnológica e no suprimento de bens estratégicos. Este desafio torna-se premente, pois as disputas entre nações por produtos necessários ao enfrentamento da Covid-19 e as limitações ao intercâmbio comercial impostas pela contingência do isolamento e fechamento de fronteiras apontam para uma verticalização maior das cadeias produtivas em cada país. Este assunto, cabe lembrar, já vinha sendo debatido na agenda do ambiente e sustentabilidade.
Desenha-se, assim, com imensa clareza, uma lição de casa imediata após a superação da presente crise: uma política industrial eficaz, capaz de recuperar a perda de competitividade do setor provocada pelos conhecidos entraves do “custo Brasil”, inseri-lo na Manufatura Avançada e pavimentar nosso caminho para alcançarmos e mantermos crescimento sustentado de no mínimo quatro por cento ao ano.
*Fernando Valente Pimentel é presidente da Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecção (Abit).
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