Dados apurados pela ABINT mostram o esforço da indústria nacional para atender ao mercado e manter a competitividade em cenário desafiador
A indústria brasileira de nãotecidos e tecidos técnicos é um ator importante, mas por vezes invisível, da economia nacional. Por meio do fornecimento de matérias-primas essenciais, apoia e impulsiona o desenvolvimento de importantes cadeia produtivas, como a automotiva, da construção e infraestrutura, higiene pessoal, médico hospitalar e agro, entre outras. Trata-se de uma indústria que, nos últimos cinco anos, investiu mais de R$ 600 milhões em ampliação de capacidade e inovação, além de gerar postos de trabalho e impostos, para atender setores estratégicos da economia brasileira.
Segundo a Associação Brasileira das Indústrias de Nãotecidos e Tecidos Técnicos (ABINT), a indústria brasileira é líder na América Latina, contando com algumas das maiores empresas mundiais no setor, um amplo portfólio de tecnologias e capacidade produtiva para atender a demanda nacional. No total, cerca de 100 empresas empregaram 17 mil pessoas na produção de mais de 370 mil toneladas em 2024.
Ainda assim, os dados apurados pela ABINT descrevem um cenário preocupante: em 2024, o aumento da demanda por nãotecidos e tecidos técnicos, além de tímido em função do baixo crescimento econômico e da redução do poder de compra da população, foi superado pelo crescimento das importações.
“Sabemos que a participação da indústria no PIB vem seguindo uma trajetória de queda desde a década de 80. No entanto, o excesso de capacidade resultante dos investimentos feitos ao redor do mundo para atender o pico de demanda da pandemia – e que agora se encontram ociosos – está intensificando a concorrência desleal e acelerando mais do que nunca a substituição de produtos fabricados no Brasil.”, comenta Mateus Inacio, presidente da entidade.
O excesso de capacidade mencionado por Mateus é observado em todo o mundo. Segundo dados do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC – Comextat), o volume de importações de nãotecidos e tecidos técnicos aumentou 32% entre 2019 e 2024, enquanto o valor FOB caiu 14% em dólares. O acumulado dos quatro primeiros meses de 2025 já mostra um aumento de 28% no volume importado em comparação ao mesmo período de 2024. No caso de artigos confeccionados, incluindo máscaras descartáveis, as importações aumentaram 78% em volume e reduziram 39% em preço médio FOB em dólares entre 2019 e 2024, e o volume acumulado nos quatro primeiros meses de 2025 cresceu 288% em relação ao mesmo período do ano anterior.
“Quando a fabricação local é substituída por importações, cessa também a demanda pelas matérias-primas, criando um efeito dominó que impacta diversos setores da economia”, explica Inacio. Segundo a ABINT, os efeitos nefastos deste movimento puderam ser observados durante a pandemia, quando o salto na demanda por máscaras e respiradores encontrou países fortemente dependentes de produtos chineses, que se tornaram escassos da noite para o dia. Neste cenário, o tempo de resposta para aquisição, montagem e comissionamento de equipamentos para o restabelecimento da produção local dos produtos acabados e seus insumos pode não ocorrer na velocidade necessária. Por este motivo, proteger a indústria nacional é tão importante: além de gerar empregos, ela também garante a soberania sobre o abastecimento de produtos essenciais.
EQUIDADE E PREFERÊNCIA PELO PRODUTO NACIONAL
Durante a pandemia, a indústria brasileira de nãotecidos e tecidos técnicos se mobilizou e investiu R$ 400 milhões para expandir em mais de 22 mil toneladas a capacidade produtiva de insumos para a fabricação de itens de proteção respiratória e hospitalar. Atualmente, apenas uma fração dos 150 fabricantes de máscaras e respiradores, que produziam 500 milhões de unidades por mês durante a pandemia, continuam operando, e o consumo nacional está voltado a ser abastecido por produtos acabados importados, repetindo o movimento observado no passado.
Inácio, que também é o Chief Operating Officer (COO) da Fitesa, argumenta: “O agravamento da concorrência desleal de produtos importados ameaça a economia brasileira como um todo. Pequenos negócios são responsáveis pela maior parte da geração de empregos, e um ambiente de negócios pouco competitivo inibe o empreendedorismo. Este não é um fato isolado, e alguns países, como os Estados Unidos, estão investindo em programas de compras governamentais que priorizam fabricantes locais como medida defensiva”. O executivo se refere, por exemplo, ao “Buy American Act” (“Lei Compre Americano”), lei que incentiva agências federais dos Estados Unidos a comprar bens fabricados localmente, com penalidades aos importados.
Segundo análise da ABINT, não existe aqui equidade competitiva entre produtos importados e fabricados localmente. Enquanto a indústria brasileira trabalha com afinco no cumprimento de normas técnicas, que avalizam a confiabilidade dos produtos e dos processos produtivos, e de requisitos legais, que controlam que as empresas operem em conformidade com padrões ambientais, sociais e fiscais, fabricantes de fora do país não estão necessariamente submetidos às mesmas exigências e, consequentemente, podem operar com custos mais baixos. A competitividade da indústria nacional é prejudicada ainda pelos já conhecidos desafios do “Custo Brasil” – entre eles a variação cambial, a dificuldade de acesso ao crédito, a defasagem de infraestrutura logística e a burocracia em torno de importação de maquinário e equipamentos.
Esta combinação de fatores cria um cenário frágil ao ataque predatório de países onde o ambiente de negócios, através da redução da burocracia ou do acesso a incentivos, é mais favorável. Como resultado, a taxa de ocupação da capacidade produtiva de nãotecidos e tecidos técnicos no Brasil foi de apenas 68,7% em 2024, com um crescimento tímido (0,7%) da produção em relação ao ano anterior.