AÇÕES PARA REDUZIR A PEGADA DE CARBONO NA MODA

Emergência climática exige soluções para o agora

É consenso científico internacional que, para evitar os piores danos climáticos, as emissões líquidas globais de dióxido de carbono (CO2) causadas pelo homem precisam cair cerca de 45% em relação aos níveis de 2010 até 2030, atingindo zero líquido por volta de 2050. O aquecimento global é proporcional às emissões cumulativas de CO2, o que significa que o planeta continuará se aquecendo enquanto as emissões globais permanecerem acima de zero. Isso implica que os danos climáticos causados ​​pelo aquecimento global continuarão aumentando enquanto as emissões persistirem. Sua empresa quer fazer parte do problema ou achar um caminho para a mitigação?

Para cada marca de moda alinhada aos parâmetros do Acordo de Paris (reduzir as emissões de gases de efeito estufa e não ultrapassar 1,5 ºC no aquecimento global), quase seis estão aumentando sua poluição, quando deveria ser o contrário. Isso de acordo com uma nova análise do grupo autônomo californiano de defesa ambiental Stand.earth, cujo relatório recém-lançado Fossil Free Fashion Scorecard 2025 avalia as principais marcas globais de vestuário e calçados em diversos indicadores climáticos.

O relatório observa que, das 42 marcas analisadas, 14 (ou 33% das marcas) relataram uma redução sustentada da poluição de mais de 10% em relação à sua linha de base, com apenas três empresas de moda (7%) tendo feito isso em conformidade com a meta de 1,5 °C, a referência fundamental do Acordo de Paris. Ao mesmo tempo, 17 das 42 marcas (40%) aumentaram sua pegada de carbono em relação à sua linha de base, superando aquelas que se mantiveram na meta de 1,5 °C por uma margem de quase 6 para 1.

Esse relatório analisa 42 marcas globais com base em seu crescimento e proeminência global, utilizando dados publicamente disponíveis para determinar as pontuações. As empresas foram avaliadas em cinco áreas de impacto: transparência climática e energética; manufatura renovável e com eficiência energética; defesa do clima; materiais de baixo carbono e livres de desmatamento; e transporte sustentável.

Entre as descobertas mais preocupantes está o fato de que a varejista online Shein, que recebeu nota “F” no relatório, aumentou suas emissões absolutas em mais de 170% em apenas dois anos – agora emitindo quase tanta poluição por ano quanto todo o Líbano. Em particular, os pesquisadores do relatório observam que a estratégia de lançamento rápido da Shein, ou o ultra fast-fashion, é “alarmante”, principalmente porque envolve o envio de pacotes individuais diretamente aos consumidores por frete aéreo em vez de transporte terrestre ou marítimo.

Outras marcas que receberam nota “F” incluem Boohoo, Aritzia, Columbia e Under Armour, que foram criticadas por não divulgarem metas climáticas ou energéticas significativas e por não relatarem nenhum apoio significativo a iniciativas de descarbonização em suas cadeias de suprimentos.

“O Fossil Free Fashion Scorecard de 2025 deixa claro que a indústria da moda ainda não está tomando as medidas decisivas necessárias para se alinhar às metas climáticas globais”, disse Todd Paglia, diretor-executivo da Stand.earth. “Embora vejamos algumas marcas progredindo, a maioria das outras está perdendo o momento ou se esquivando completamente de sua responsabilidade, o que é alarmante. Além disso, muitas marcas não estão apoiando seus fornecedores na transição para energia limpa, o que significa que o ônus financeiro da transição impacta desproporcionalmente os fabricantes. A indústria tem os recursos para agir, mas, em vez disso, vemos empresas fazendo promessas vazias enquanto continuam seus negócios normalmente. Marcas que lideram o caminho, como a H&M, estão provando que ações significativas são possíveis, mas devem acelerar seus esforços e pressionar seus concorrentes a seguirem o exemplo. Instamos as marcas de moda a publicar planos detalhados de transição climática com marcos intermediários e planos de engajamento com fornecedores, priorizar a eliminação gradual de sintéticos à base de carvão e petróleo e, em vez disso, priorizar energia renovável e materiais sustentáveis, ao mesmo tempo em que apoiam os fornecedores com financiamento e contratos de longo prazo para permitir a descarbonização. Marcas maiores, em particular, podem usar sua força para defender políticas climáticas mais fortes para garantir igualdade de condições e longevidade para todo o setor.”

A moda continua sendo uma das indústrias mais poluentes do mundo, responsável por pelo menos 4% de toda a poluição climática, e as emissões do setor devem aumentar. A maior parte das emissões do setor ocorre na cadeia de suprimentos, e as fontes de energia do setor estão em alguns dos países mais vulneráveis ​​ao clima do mundo, como Bangladesh, Índia, Paquistão, Vietnã e Camboja. Com esses países dependendo predominantemente de combustíveis fósseis – e o setor sendo notório por suas margens estreitas – os fabricantes têm expressado a necessidade de apoio das marcas para apoiar seus esforços de descarbonização. Um estudo de 2021 da Universidade de Harvard descobriu que uma em cada cinco mortes no mundo pode estar ligada à poluição do ar causada pela queima de combustíveis fósseis, reforçando a responsabilidade do setor por uma ação climática rápida.

H&M: empresa sueca ficou entre as três únicas listadas no relatório da Stand.earth por metas rigorosas nas emissões líquidas de GEE. / Foto: Divulgação

Embora limitados, há sinais de progresso: liderando o grupo estavam a H&M e a Eileen Fisher, que obtiveram notas “B+” e “B-”, respectivamente. O relatório destaca a H&M por seus compromissos climáticos e transparência, seus esforços para apoiar e financiar a descarbonização de fornecedores, especialmente em Bangladesh, bem como suas iniciativas eficazes de defesa do clima. A varejista sueca investiu, apenas em 2024, US$ 179 milhões em ações para alcançar mais medidas de descarbonização durante seus processos de produção e distribuição das peças. A Eileen Fisher, por outro lado, foi elogiada por seus esforços em prol da circularidade, particularmente seu trabalho de eliminação gradual de fibras de combustíveis fósseis e ampliação da escala de materiais reciclados, o que os pesquisadores consideram “impressionante para uma pequena marca”. O relatório também elogia a empresa de roupas esportivas Lululemon, que estabeleceu uma meta de 50% de eletricidade renovável para sua cadeia de suprimentos até 2030, observando que a marca melhorou significativamente desde a publicação do último relatório, em 2023.

Outro ponto positivo é que 95% das marcas agora oferecem programas de revenda ou reparo, sinalizando que as marcas estão enxergando a oportunidade econômica em modelos de negócios circulares. No entanto, os pesquisadores observam que, embora esses esforços sejam positivos, a maior parte dos impactos acontece na cadeia de suprimentos, que continua sem solução.

“A indústria da moda está em uma encruzilhada, e as marcas precisam decidir se liderarão a transição para um futuro sem combustíveis fósseis ou se continuarão a alimentar a crise climática”, disse Rachel Kitchin, ativista corporativa sênior de Clima da Stand.earth. “Os resultados deste relatório mostram que, embora algumas marcas estejam avançando, a maioria ainda não age com a urgência necessária. Formuladores de políticas, grupos do setor e cidadãos têm um papel a desempenhar na responsabilização das marcas e na promoção de mudanças. Precisamos ver mais marcas assumindo compromissos ambiciosos e implementando ações concretas – porque os riscos são muito altos para qualquer coisa menos do que isso.”

MODA RÁPIDA, MAIS AINDA EMISSÕES DE CO2

Temos ciência de que o modelo de produção e consumo do fast-fashion iniciou essa aceleração da poluição global de modo geral, e o ultra fast-fashion, liderado pela Shein, veio para dar uma guinada – para pior – na situação.

Embora as emissões de carbono relacionadas à moda não possam ser exclusivamente associadas à fast-fashion, esta última continua sendo uma das maiores contribuintes. De fato, a necessidade da indústria de acompanhar as tendências leva à produção contínua de novas peças de vestuário, aumentando significativamente sua pegada ambiental. Os consumidores frequentemente compram e descartam roupas perfeitamente usáveis ​​e, muitas vezes, ainda novas, à medida que novas tendências surgem. Esse ciclo de compra e descarte de roupas aumenta consideravelmente as emissões de carbono, exacerbando as preocupações ambientais existentes.

De acordo com dados de 2023 do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA), a indústria da moda contribui com 10% das emissões globais de carbono anualmente, mais do que as emissões de voos internacionais e transporte marítimo combinados. Se as tendências atuais se mantiverem, suas emissões de gases de efeito estufa (GEE) deverão aumentar em mais de 50% até 2030.

Segundo o Earth.org, as principais fontes de emissões de GEE na indústria da moda provêm, em primeiro lugar, da produção de tecidos, que, para se manter economicamente competitiva, na maioria dos casos acaba adotando materiais baratos como o poliéster, uma fibra sintética e barata feita de petróleo, um combustível fóssil não renovável, e que pode gerar emissões de carbono três vezes maiores do que as geradas pela fabricação do algodão, levando à poluição atmosférica grave. Estima-se que uma única camiseta de poliéster emita 5,5 kg de CO2 e uma feita de algodão cerca de 2,1 kg de CO2.

Em segundo lugar, estão as localidades onde são produzidas as peças de fast-fashion: mais de 60% dos têxteis são utilizados pela indústria do vestuário, com uma parcela substancial da produção ocorrendo em países em desenvolvimento, como Índia e Bangladesh, além da China, pois dependem há décadas de usinas movidas a carvão para a fabricação de roupas, ampliando ainda mais a pegada de carbono de cada peça.

No case Shein, que aumentou suas emissões absolutas de carbono em quase 50% em um ano (2023), superando as emissões do Paraguai ou de quatro usinas termelétricas juntas no mesmo período (foram 16,7 milhões de toneladas), por exemplo, a fashiontech havia anunciado o compromisso de reduzi-las em 25% até 2023 e zerar suas emissões líquidas até 2025. Difícil saber como. E a Temu vem seguindo o mesmo caminho.

ESCOLHAS DE IMPACTO

Para a redução das emissões de GEE, algumas escolhas são fundamentais. Entre elas, fontes energéticas, logística (transportes aéreo, terrestre e marítimo), embalagens e, obviamente, os materiais que serão usados na produção, como tecidos, aviamentos, tingimentos, estamparia, etc. Se o processo for circular, melhor ainda.

Recentemente, a Associação Brasileira do Varejo Têxtil (ABVTEX), junto à plataforma Textile Exchange e apoio da Rever Consultoria, lançou o Guia de Uso da Matriz de Materiais e Fibras Preferenciais (algodões certificados, poliéster reciclado e fibras regenerativas), que propõe práticas para apoiar varejistas, fornecedores e profissionais do setor nas tomadas de decisões mais sustentáveis sobre o uso de matérias-primas, com orientações detalhadas de como incorporá-las nas etapas de desenvolvimento de produtos, desde o design até a comunicação ao consumidor.

 “A circularidade e o uso de materiais reciclados não são apenas tendências, mas parte de uma transformação profunda no setor. Com o guia, auxiliamos as empresas a incorporarem critérios técnicos e socioambientais em seus processos produtivos, ampliando o compromisso com a sustentabilidade de forma estruturada e colaborativa”, destaca Edmundo Lima, diretor-executivo da ABVTEX. “Trata-se de promover escolhas com base em evidências, certificações reconhecidas e metas reais de descarbonização. É uma transformação necessária, possível e urgente – e que já está em curso”, reforça.

JORNADA DA DESCARBONIZAÇÃO

Aqui no Brasil, outras ações vêm sendo fomentadas para que a indústria da moda tome o caminho de um impacto positivo e gere menos CO2. A Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecção (Abit) lançou, em setembro de 2024, a Liga da Descarbonização, que visa dar visibilidade às empresas associadas que aderirem ao compromisso de medir as emissões de gases de efeito estufa (GEE) e publicar seu inventário. As empresas que aderirem à Liga assinarão uma Carta Compromisso, se comprometerão a mensurar suas emissões de GEE pelo modelo GHG Protocol e tornar público o inventário até 2027, já que esta é a primeira etapa para descarbonização do setor. De acordo com a Abit, a adesão acontece até o mês de julho deste ano, com previsão de publicação em setembro, numa página exclusiva no site da entidade.

Camila Zelezoglo, coordenadora da área de Sustentabilidade e Inovação da Abit, comentou durante a apresentação da Liga que se estima que a cadeia da moda global seja responsável de 2% a 8% das emissões totais de GEE e, de acordo com dados do Apparel Impact Institute, a produção de tecidos e malhas responde por 55% das emissões globais do setor, seguida pela extração de matérias-primas, com 21%, e pelo processamento dessas matérias em fios e filamentos, com 15%. A produção de vestuário responde por 9%.  

Também neste caminho, o SENAI-SP lançou, em agosto de 2024, a Jornada da Descarbonização, uma iniciativa estratégica para apoiar a indústria na transição para uma economia de baixo carbono. Arthur Dias, diretor de unidade do SENAI-SP, conta que embora tenha sido idealizado e implantado inicialmente no estado de São Paulo, o programa, que foi desenhado para ser prático, efetivo e aplicável à realidade da indústria brasileira, tem grande potencial de escala nacional, e que os resultados já alcançados demonstram que é possível replicar a iniciativa em outros estados, contribuindo de forma significativa para a descarbonização da indústria brasileira em diversos segmentos, inclusive no têxtil e confecção, que já conta com cerca de 100 empresas participantes. Detalhe: o programa é gratuito.

“Disponibilizar gratuitamente uma jornada estruturada de descarbonização, com todo o suporte técnico do SENAI, representa um passo fundamental para democratizar o acesso à sustentabilidade industrial, especialmente para pequenas e médias empresas, que muitas vezes não têm os recursos para iniciar esse processo por conta própria”, ressalta Arthur.

Ele explica que o tempo médio para a conclusão das três primeiras etapas, que incluem diagnóstico, gestão de dados e entrega do inventário de emissões, é de até três meses. Já o plano de redução de carbono é desenvolvido de forma personalizada, conforme as características e necessidades de cada empresa, conforme o escopo definido em projeto.

A unidade brasileira da Hanesbrands, em Cotia (SP), é uma das empresas que está na Jornada da Descarbonização, e que, além da assessoria técnica do SENAI-SP, também conta com o suporte do Programa Investimentos Transformadores de Eficiência Energética na Indústria (PotencializEE). Esse programa faz parte da cooperação Brasil-Alemanha para promover a eficiência energética em pequenas e médias indústrias do Estado de São Paulo, e é liderado pelos ministérios de Minas e Energia e do Desenvolvimento, Indústria e Comércio, com apoio financeiro do fundo europeu de descarbonização, Mitigation Action Facility.

A primeira etapa da Jornada na Hanesbrands foi a substituição de um sistema complexo e pouco eficiente de compressores de ar por uma única máquina de alta performance, capaz de suprir toda a demanda da fábrica. Com isso, além de reduzir o consumo de energia elétrica, a empresa passou a recuperar o calor gerado no processo de compressão para pré-aquecer a água utilizada na caldeira. O consultor do SENAI-SP, Josiel Rodrigues Godinho, explica que 70% da energia utilizada torna-se perda térmica, que é inerente à tecnologia, sendo que somente 30% vira ar comprimido.

“A energia dissipada em forma de calor está sendo usada para a reposição de água da caldeira. A cada 6 °C que conseguimos elevar na temperatura da água, obtemos uma economia de aproximadamente 1% no consumo de combustível da caldeira”, explica. “Além da redução no uso de gás natural e das emissões de CO₂ equivalentes, as medidas adotadas proporcionarão uma redução de 22% no consumo de energia – um ganho significativo para a indústria”, conclui Josiel.

Além das melhorias já implementadas, a Hanesbrands avalia novos investimentos para expandir as ações de eficiência energética em outras áreas da unidade, como a modernização do sistema de climatização em setores com cerca de 80 teares, utilizados na fabricação de meias de alta compressão, que precisam de um controle rigoroso de temperatura e umidade para garantir a integridade dos fios e a qualidade do produto. Com a instalação de uma bomba de calor, no futuro, o calor dissipado nos sistemas de climatização passará a ser recuperado para aquecer a água usada na tinturaria – etapa crítica para a fixação de pigmentos nos tecidos.

“Mesmo sendo uma indústria com equipamentos novos e bem conservados, conseguimos tornar esse sistema mais moderno e identificar oportunidades significativas de ganho energético. Isso mostra que eficiência e inovação caminham juntas, independentemente do ponto de partida”, destaca Godinho.

Para Mônica Zanini, gerente-geral da Hanesbrands, a parceria da empresa com o SENAI-SP e o PotencializEE trouxe um olhar mais estratégico para a inovação, ampliando a visão sobre melhorias a serem implementadas internamente no setor de energia da empresa.

“Como resultado dessa parceria, foi desenvolvido o projeto Energy Recovery, que recupera o calor gerado pelo compressor de ar para aquecer a água utilizada na alimentação da caldeira. Isso é eficiência em ambos os lados, pois utilizamos o compressor de ar para gerar calor e aquecer a água que vai para caldeira. Isso diminui o custo, traz menor consumo de energia, reduz a emissão de gases, melhora o processo e o otimiza em termos de tempo. É um ganha-ganha para todo mundo, para a empresa e para o planeta. É o que faz a gente ser uma empresa sustentável”, afirma a gerente-geral.

“É importante destacar que o movimento por uma cadeia produtiva mais sustentável está ganhando força: grandes magazines já começam a exigir o mapeamento de emissões de carbono de seus fornecedores. Ou seja, aderir à Jornada de Descarbonização não é apenas uma iniciativa ambientalmente responsável, mas uma medida estratégica para garantir competitividade e permanência no mercado. É o momento ideal para que as empresas se antecipem às exigências e estejam preparadas para atender aos novos critérios de sustentabilidade que estão moldando o futuro da moda e da indústria”, conclui Arthur Dias.

Para informações gerais sobre o programa, é só acessar https://jornadadescarbonizacao.sp.senai.br.

MUDANÇAS NA BASE

Entre as têxteis brasileiras que vêm investindo na implantação de uma cultura holística de sustentabilidade, a Vicunha é um ótimo exemplo.

German Alejandro Silva, diretor-executivo Comercial e de Marketing da Vicunha, conta que em razão de uma série de medidas adotadas pela empresa constataram resultados positivos na diminuição de sua pegada de carbono. “Em nosso último relatório de sustentabilidade, publicado em 2024, relatamos a redução das emissões de CO2 dos escopos 1 e 2, que diminuíram 17,7% e 29%, respectivamente, entre 2022 e 2023.”

Uma das medidas que vem contribuindo para a redução de suas emissões de carbono é o uso de biomassa na geração de vapor em seus processos industriais, com reaproveitamento de materiais orgânicos que antes seriam descartados, como fragmentos de madeira de cajueiro, algaroba, eucalipto, além de cascas de castanha de caju, todos oriundos de áreas próximas às unidades fabris, sendo grande parte do material utilizado proveniente de plantios manejados de forma sustentável e/ou composta de resíduos que, de outra forma, poderiam ser destinados a aterros ou até mesmo descartados de maneira inadequada ao meio ambiente.

“Essa história remonta a 20 anos atrás, quando substituímos o uso de gás natural para alimentar as caldeiras de fábricas no Brasil por biomassa. A adoção de biomassa evita que utilizemos fontes de energia como oscombustíveis fósseis, que emitem maiores quantidades de CO2 na atmosfera”, comenta German.

Outra, mais recente, é um acordo firmado este ano com a Enel para que as unidades fabris da Vicunha Têxtil no Nordeste (Maracanaú e Pacajus, no Ceará, e em Natal, no Rio Grande do Norte) passem a consumir energia eólica própria, proveniente do complexo eólico Lagoa dos Ventos, no Piauí. Desta forma, a tecelagem pode reduzir em 75% suas emissões de carbono relacionadas à geração de energia elétrica para suas fábricas no país. “Isso reforça o protagonismo da Vicunha em sustentabilidade no setor têxtil, contribuindo para uma cadeia de moda responsável e de baixo carbono”, diz o diretor.

Com seu modelo verticalizado, o Grupo Malwee vem liderando mudanças estruturais na produção de vestuário no Brasil. Em 2019, começaram a calcular sua pegada de carbono, e foi um dos primeiros a implementar um Relatório de Impacto e a estabelecer metas de redução de emissões conforme as diretrizes da Science Based Targets initiative (SBTi). Atualmente, o Grupo Malwee utiliza energia eólica renovável em 100% de suas operações fabris. Essa energia é adquirida por meio do mercado livre, com rastreamento da fonte geradora, e está em andamento um projeto de conversão de novas máquinas para funcionamento com energia limpa.

“Além das iniciativas internas, sempre incentivamos e buscamos que nossa cadeia de fornecimento esteja alinhada aos nossos compromissos ambientais e sociais. Acreditamos que ser sustentável sozinho não é suficiente. No entanto, não podemos afirmar que nossas medidas tenham servido como exemplo, mas atuamos com o propósito de inspirar a mudança. Entendemos que a fórmula do fast-fashion não se encaixa mais num mundo que enfrenta emergências climáticas e humanitárias. Por isso, o Grupo Malwee e nossas marcas propõem um novo modelo de produção e consumo de moda. Nosso objetivo é mostrar que é possível criar uma moda ética e sustentável, que seja benéfica para o planeta e para as pessoas”, afirma Renato Martins, gerente de ESG da Malwee.

MODA QUE INSPIRA                

Em um marco para a moda nacional, a Malwee ainda anunciou o lançamento da camiseta Ar.voree, feita com a primeira malha do Brasil com tecnologia embarcada capaz de capturar gás carbônico (CO₂) do ambiente e eliminá-lo durante o processo de lavagem. A novidade chegou aos consumidores no dia 22 de maio – Dia Internacional da Biodiversidade –, com um modelo de camiseta na cor preta, em edição limitada de 250 peças, com venda exclusiva pelo e-commerce da marca, e segundo Renato, teve uma receptividade incrível.

Camiseta Ar.voree, da Malwee, que captura CO₂. / Divulgação

A linha Ar.voree é fruto de uma parceria inédita com a startup Xinterra, de Singapura, por meio da tecnologia COzTERRA, e levou dois anos de pesquisa. Funciona assim: a malha da camiseta, com a tecnologia inovadora aplicada, captura o CO₂ da atmosfera, que, ao entrar em contato com o sabão líquido ou em pó durante a lavagem, é transformado em bicarbonato de sódio, sendo eliminado de forma segura. Esse processo também recarrega os agentes de captura de CO₂ na camiseta, permitindo que ela continue funcionando como um “filtro de carbono” a cada uso. Uma única peça é capaz de capturar a mesma quantidade de CO₂ que uma árvore adulta.

“Por enquanto, a tecnologia só se aplica à malha 100% algodão e na cor preta que, segundo testes, consegue absorver uma porcentagem maior de CO₂. Mas seguimos desenvolvendo alternativas para viabilizar a tecnologia em outros tecidos e em outras cores”, diz o gerente de ESG da Malwee.

Ele também fala sobre os desafios em escalar a tecnologia para que possa ser aplicada numa quantidade maior de peças, destacando dois avanços essenciais para que isso aconteça. “O primeiro é ampliar a aplicabilidade da tecnologia para além da camiseta preta de algodão que, atualmente, é o único modelo compatível com o processo. Essa limitação restringe a escalabilidade da produção. O segundo ponto é a otimização do processo de aplicação do gel fornecido pela empresa Xinterra, de Singapura, nossa parceira no projeto. Como essa etapa ainda é recente, o primeiro lote exigiu um processo mais complexo. Estamos trabalhando para tornar os dois pontos mais eficientes e adaptáveis à produção em larga escala.”

Outras marcas e varejistas também vêm se destacando rumo à redução de suas pegadas de carbono, como a C&A Brasil, que anunciou sua meta de reduzir em 42% suas emissões diretas e indiretas até 2030, validada pela SBTi, superando em 12% a meta anterior, de 30%, aprovada em 2020. Essa validação reforça que as metas da C&A estão em conformidade com os esforços globais para limitar o aquecimento do planeta a 1,5 °C.

Entre suas ações para alcançar o novo target, desde 2023 todas as operações da C&A Brasil, como lojas, centros de distribuição e escritórios, são abastecidas com energia 100% renovável, proveniente de fontes como o Complexo Eólico Renascença, no Rio Grande do Norte. Dessa maneira, evita a emissão de 10 mil toneladas de CO₂ anualmente, o equivalente ao plantio de mais de 70 mil árvores. Na parte logística, conta com uma frota parcialmente verde, composta de 11 veículos elétricos e 31 híbridos, que já reduziram 286 toneladas de CO₂ no último ano.

A meta de redução de emissões integra um plano mais amplo da C&A Brasil para 2030, que inclui: uso de 80% de matérias-primas sustentáveis nas coleções; redução de 50% no uso de plásticos; 50% dos produtos desenvolvidos com base em princípios de circularidade. Em 2024, a companhia também passou a integrar o Índice Carbono Eficiente (ICO2) da B3, reafirmando seu compromisso com a transparência e a eficiência na gestão de emissões.