Medida estudada pelo governo federal pode impactar no aumento de custos de todas as malharias, tecelagens e confecções do país
Em meio às discussões relativas à concorrência da indústria nacional contra as importações das plataformas virtuais sem o pagamento de impostos correspondentes, o governo estuda criar maior oneração para os têxteis. A medida, conforme explica o advogado, consultor de comércio internacional da UNO Trade, Roberto Kanitz, irá atingir todas as malharias, tecelagens e confecções do Brasil, colocando eventual direito antidumping nas importações de fios de poliéster texturizado.
O presidente do Sintex – Sindicato das Indústrias de Fiação, Tecelagem e do Vestuário, José Altino Comper, destaca que o fio de poliéster, depois do algodão, é o mais utilizado no Brasil e a produção nacional não é suficiente para abastecer a indústria têxtil brasileira. Conforme dados da Abrafas – Associação Brasileira de Produtores de Fibras Artificiais e Sintéticas, a produção de fios de poliéster no país hoje é de cerca de 80 mil toneladas por ano, enquanto o consumo passa de 300 mil toneladas anuais. “Qualquer alteração relativa à importação desse fio tem impacto em toda a cadeia de produção de roupas, calçados, cama, mesa e banho e afeta todos os cidadãos brasileiros”, explica Comper.
O presidente do Sintex acrescenta que, com essa medida, o custo de se produzir no Brasil aumentaria para as malharias, tecelagens e confecções, que já estão sofrendo enorme concorrência de roupas prontas importadas.
Kanitz alerta que “mais de 1 milhão de empregos nas confecções e mais de 160 mil empregos nas tecelagens e malharias estão ameaçados, somente para beneficiar duas empresas (uma norte-americana e outra mexicana) instaladas no Brasil e que empregam, no total 900 trabalhadores”. Essas empresas, explica o advogado, não produzem o fio de poliéster texturizado de forma integrada nem completa em território nacional, e a matéria-prima que compram da China ou Índia está isenta do imposto de importação.
“Além do risco dos empregos, quem será prejudicado não é só o empregador, mas também o trabalhador e os consumidores que pagarão mais caro pelos produtos têxteis”, comenta Comper.
IMPACTOS
Segundo estudo de impacto econômico elaborado pelos economistas Sérgio Goldbaum e Euclides Pedrozo Junior, sócios fundadores da GPM Consultoria Econômica, após a medida imposta haveria, em curto espaço de tempo, a perda de aproximadamente 4.102 postos de trabalho, mas, na prática, acredita-se que este número será muito superior.
A tarifa extra que poderá ser imposta chegaria a USD 0,5857/Kg (aproximadamente R$ 2,90/Kg), o que geraria um impacto na ordem de 29% nesta matéria-prima essencial e relevante para malharias, tecelagens e tinturarias. Estima-se que 60% de todos os produtos têxteis contenham o poliéster texturizado como componente.
O impacto seria sentido em toda a cadeia, especialmente na sua ponta final, e afetaria roupas, calçados, automóveis, cama-mesa-banho, mobiliário, entre outros. “Várias empresas do ramo de malharia e tecelagem já se posicionaram no sentido de mudar suas plantas fabris para regiões fora do território brasileiro, onde há isenções fiscais, como Paraguai, e vigora a Lei de Maquila”, comenta Kanitz.
O advogado conclui, ainda, que a margem de lucro da indústria que agrega valor ao produto final é muito pequena comparada às margens obtidas pelas fornecedoras do fio de poliéster texturizado.
ANTIDUMPING
Conforme consta no Ministério da Economia, os direitos antidumping têm como objetivo evitar que os produtores nacionais sejam prejudicados por importações realizadas a preços de dumping, prática esta considerada como desleal em termos de comércio em acordos internacionais.
O presidente do Sintex destaca que os números do Brasil mostram que a medida não se aplica aos fios de poliéster, uma vez que a produção nacional é quase quatro vezes menor que o consumo. “Em um país cujo custo de produção é extremamente alto, precisamos estar alertas e lutar contra propostas como essas, que penalizam a indústria nacional e todos os brasileiros, que verão seus custos aumentarem cada vez mais”, explica Comper. Dessa forma, finaliza o executivo, “não seria do interesse do governo brasileiro como um todo aplicar essa medida, já que os malefícios para a economia seriam muito maiores do que os benefícios às duas empresas texturizadoras do fio de poliéster”.