BRASIL PRECISA AMPLIAR INTEGRAÇÃO GLOBAL, MAS SEM DESVANTAGENS COMPETITIVAS

Por Fernando Valente Pimentel

É natural que os países passem a reavaliar seus posicionamentos estratégicos em meio ao cenário de transformações geopolíticas e tensões crescentes no comércio internacional, provocadas, dentre outros fatores, por políticas tarifárias unilaterais como as recentemente adotadas pelos Estados Unidos, A busca por novos mercados e parceiros comerciais torna-se imperativa, mas deve ser conduzida com responsabilidade e clareza quanto às condições de competição.

No caso do Mercosul, destacam-se positivamente os avanços nos acordos com a União Europeia e com a EFTA (Associação Europeia de Livre Comércio). Trata-se de entendimentos mais maduros, construídos ao longo de décadas de diálogo, que compartilham valores fundamentais, como segurança jurídica, previsibilidade regulatória, padrões de sustentabilidade e respeito às normas trabalhistas. São acordos que podem gerar ganhos concretos, tanto econômicos quanto institucionais, para os países do bloco sul-americano.

Outras possibilidades também se apresentam com bom potencial, como um acordo com o Canadá. Embora ainda em estágio menos avançado, há uma base sólida para a construção de uma parceria que privilegie a complementaridade econômica, respeitando as diferenças estruturais e buscando convergência normativa.

Por outro lado, é preciso ter cautela ao considerar eventuais acordos com países da Ásia, uma possibilidade que vem sendo abordada pela imprensa. São necessários cuidados na interação comercial com essa região, pois apesar de ela ser hoje o centro mais dinâmico da economia global, apresenta desafios consideráveis. As assimetrias de regras ambientais, trabalhistas, sanitárias e regulatórias são profundas e, na prática, dificultam qualquer tipo de competição equilibrada. Para setores manufatureiros como o têxtil e de confecção, que empregam milhões de pessoas e geram valor agregado de maneira capilarizada, a abertura irrestrita a produtos de economias com estruturas de custos e modelos produtivos tão distintos pode gerar desindustrialização, perda de empregos e desestímulo à inovação.

Mesmo sem acordos em vigor, nações asiáticas como China, Bangladesh e Vietnã já figuram como as principais origens das importações têxteis e de roupas no Brasil. A entrada desses produtos ocorre em larga escala, muitas vezes com subsídios e/ou práticas comerciais que não condizem com os compromissos internacionais assumidos no campo da OMC (Organização Mundial do Comércio). Promover mais abertura sem nivelamento de regras seria agravar esse desequilíbrio.

A construção de uma política comercial eficaz e coerente para o Brasil e para o Mercosul como um todo deve ter como premissa básica a simetria regulatória e o respeito às condições justas de concorrência. Acordos de livre comércio devem promover intercâmbio equilibrado, com ganhos recíprocos e sustentáveis, e não se transformar em instrumentos de pressão sobre setores produtivos estratégicos.

O Brasil precisa, sim, ampliar sua inserção na economia internacional. No entanto, esse processo deve ser estratégico, responsável e baseado em princípios que protejam o interesse nacional, a indústria, o emprego e a capacidade de inovação. A integração comercial é desejável, desde que feita com transparência, previsibilidade e equilíbrio. Livre comércio, sim, mas com regras justas para todos.

Fernando Valente Pimentel é o diretor-superintendente e presidente emérito da Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecção (Abit).

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