COP30 NO BRASIL: MODA BRASILEIRA LEVA SUAS AGENDAS, AÇÕES E REIVINDICAÇÕES À EDIÇÃO CRUCIAL DO MAIOR ENCONTRO CLIMÁTICO GLOBAL

(ABERTURA) Imagem manifesto do desfile – Vestir a Amazônia, Reflorestar o Clima I Assobio + Riachuelo / Foto: a2ateliê – Estúdio Fotográfico

Em duas semanas de uma imersão única, no coração da Floresta Amazônica, um dos mais importantes biomas do planeta, o debate sobre a situação climática esquentou, literalmente. Teria sido esse um pequeno aperitivo do que é sofrer com os efeitos do aquecimento global, com direito a uma boa dose de chuva e alagamentos? Perto das catástrofes que vêm acontecendo mundo afora, o que líderes e representantes mundiais vivenciaram durante os dias 10 a 21 de novembro em Belém (PA), na COP30, não foi nada.

Realizada anualmente, a Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas, ou Conference Of the Parties (COP), sediou aqui no Brasil uma de suas edições mais emblemáticas e cruciais para o direcionamento de ações concretas ao futuro do planeta Terra e da humanidade, cabe dizer. Exagero? Infelizmente, não. As atitudes que temos que colocar em prática são mais do que urgentes para fazer valer as metas do Acordo de Paris.

De acordo com a McKinsey, 13,5% das tecnologias necessárias para atingir as metas do Acordo já foram implementadas, representando metade do ritmo necessário ao objetivo comum. Há que se apertar o passo. Mas também de acordo com a consultoria, foi observado na COP30 que as empresas reconhecem que a transição energética vem se desenrolando de forma diferente em cada região, de olho em segurança jurídica e mecanismos eficazes de incentivos que embasem suas decisões em investimentos. Para a McKinsey, a próxima década recompensará as empresas que encararem a sustentabilidade não como obrigação, mas como a próxima grande oportunidade.

A MODA ENTROU NO CLIMA

Como uma indústria essencial a vários setores, não só o de vestuário, o têxtil e a moda, responsáveis por uma parcela considerável da poluição e emissão de gases de efeito estufa que culminaram na situação que vivemos hoje, teve um protagonismo ímpar nesta COP, inseridos em conversas oficiais e programações paralelas ao evento. Afinal, há muitas empresas e iniciativas empenhadas em mudar esse quadro, dando exemplos de ações concretas que vêm aplicando nos negócios. Melhor ainda, ver que são brasileiras.

“Foi muito importante perceber que a participação das empresas do setor não era uma participação sem pauta. Era uma participação de empresas que, de fato, estão engajadas e tinham o que falar”, aponta Camila Zelezoglo, gerente de Sustentabilidade e Inovação da Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecção (Abit), que, junto ao diretor superintendente e presidente emérito da entidade, Fernando Pimentel, participou ativamente das conversas na COP30.

Camila lembra que a moda é um setor que chama a atenção da sociedade em geral, pois a roupa faz parte do cotidiano.

“Dessa forma, a cadeia têxtil e de moda também passa a ser exemplar do que é possível, e tem um papel de educomunicação, como costumamos dizer, e até de transformação cultural. Outras cadeias produtivas que têm até mais impacto em termos de emissões não possuem esse apelo junto à sociedade. Portanto, acho que essa participação da Abit e das empresas têxteis e de moda foi muito feliz, com um senso de que o setor pôde estar presente, comunicar-se, realizar suas ativações em conversas diversas e com uma proposição muito grande também quanto à atuação”, avalia.

Camila Zelezoglo, da Abit, em painel da ABDI na COP30. / Foto: Fabio Viana – ABDI

Ela ainda ressalta que por meio da estreita parceria que a Abit possui com a Confederação Nacional da Indústria (CNI), a entidade participou de debates tanto na Green Zone quanto na Blue Zone, mas principalmente nos pautados na economia circular, materiais, logística reversa e resíduos. A CNI, inclusive, idealizou a Sustainable Business COP30 (www.sbcop30.com), que é a participação do setor privado, de forma organizada, para fazer recomendações aos negociadores da conferência em relação às diversas agendas.

“Também pudemos participar em dois momentos, uma quase sessão exclusiva e especial, apresentando a Liga de Descarbonização como uma iniciativa de engajamento empresarial, e uma participação importante em um painel que cocriamos com a Associação da Indústria de Alimentos e a própria CNI para falar da agenda de adaptação climática, que é uma agenda de que participamos, como entidade, do processo de construção da política pública de adaptação climática para a indústria a qual está sob o guarda-chuva do Plano Clima do Ministério do Meio Ambiente. Foi interessante fazer essas trocas”, completa Camila.

UMA COP QUE DEU VOZ À ECONOMIA CIRCULAR

A Fundação Ellen MacArthur, que esteve presente à COP30, destacou que essa foi a COP onde a Economia Circular entrou na pauta das discussões, bem como representou a primeira oportunidade para os negociadores climáticos analisarem as abordagens da economia circular no setor de resíduos, no âmbito do Programa de Trabalho de Mitigação estabelecido na COP26. A entidade, que participou da agenda de debates, ressaltou ainda a importância do desenvolvimento de cadeias de valor circulares para materiais de base biológica como forma de reduzir emissões, melhorar o sequestro de carbono e contribuir para a preservação da natureza, além da necessidade de uma contabilização justa e precisa das emissões na economia circular.

A equipe da Cotton Move, que também acompanhou o evento, reforça a conversa sobre circularidade – que foi tratada como infraestrutura ambiental – e mais: sobre a moda nesse contexto. Para eles, se a COP30 deixou uma mensagem clara ao setor, foi a de que não há mais espaço para narrativas dissociadas da prática: o futuro da moda exige ação comprovável, rastreável, dados abertos e relações verdadeiras com as cadeias produtivas, com as comunidades e com os territórios onde estão.

Além disso, foram incluídas nas discussões as propostas de fortalecimento do Plano Nacional de Economia Circular; metas obrigatórias de conteúdos reciclados; modelos produtivos fundamentados em durabilidade, reparo e recirculação; e a criação de fundos climáticos para recicladoras, cooperativas e costureiras.

ABIT E ABDI ASSINAM ACORDO

Durante a COP30, a Abit e a Associação Brasileira de Desenvolvimento Industrial (Abdi) assinaram um Acordo de Cooperação Técnica (ACT) para elaborar estudo sobre resíduos têxteis industriais e pós-consumo no Brasil. O acordo mapeará fluxos, volumes e práticas de destinação de resíduos têxteis para preencher lacunas de informação e apoiar políticas públicas com base em evidências. A expectativa é a de que os resultados desse estudo apoiem a entrada do setor têxtil no Recircula Brasil, programa de rastreabilidade e certificação de materiais, desenvolvido em parceria com a Associação Brasileira da Indústria do Plástico (Abiplast) e operacionalizado pela Central de Custódia.

Fernando Pimentel, da Abit, destaca que essa ideia vinha sendo gestada há algum tempo, e a importância da construção de políticas de economia circular de sustentabilidade com métricas adequadas. “Nada é possível de ser feito se você não tiver os melhores números para embasar projetos e decisões.”

“Eu gostaria de frisar também que nesta jornada de aprendizado que foi a COP 30, para mim em particular, é o sentido de que nós temos no Brasil um ecossistema integrado que vai da matéria-prima, que seja do campo, seja a matéria-prima fóssil até o produto final, ou até a passarela. E isso dentro de um contexto que nos leva a ter uma economia circular e de trabalho para transformar aquilo que seria um rejeito em algo reutilizável, poupando matérias-primas virgens. Por termos uma cadeia produtiva quase toda integrada, temos também essa oportunidade de nos desenvolvermos, sermos mais sustentáveis e resilientes”, avalia Pimentel.

VAREJISTAS MOSTRAM SEU ENGAJAMENTO

Na COP30, a moda brasileira floresceu, mostrando ao mundo o que tem carregado junto ao seu design: uma produção mais diversa, responsável e de olhos e braços abertos a redescobrir a imensidão dos brasis dentro do Brasil.

RIACHUELO

“Foi extremamente significativo – e simbólico – o Brasil sediar a COP30 na Amazônia. Estar lá lembrou a todos que precisamos proteger nossas florestas tropicais remanescentes, pois elas são essenciais para o equilíbrio da vida na Terra. A Amazônia está cada vez mais próxima de seu “ponto de não retorno”, aquele limiar além do qual não conseguirá mais reciclar carbono, passando a liberar carbono, o que agrava ainda mais as mudanças climáticas. Não podemos deixar isso acontecer.

Além disso, na COP30 houve uma participação expressiva da sociedade civil e de grupos historicamente sub-representados — povos indígenas, ribeirinhos e quilombolas do Brasil e de outros países da América Latina —, algo sem precedentes nas COPs anteriores. Esse protagonismo, visto dentro e fora da Blue Zone, trouxe as vozes de quem vive em equilíbrio com os recursos naturais para o centro das discussões e reforçou a importância da justiça climática e da inclusão social nos debates.

O Brasil aproveitou a ocasião para pautar temas cruciais para um futuro sustentável: o fomento à sociobioeconomia — capaz de manter florestas em pé e valorizar seus ativos naturais mais do que a simples extração de madeira; o lançamento ou o fortalecimento de mecanismos de financiamento para proteção e regeneração de florestas, como o Tropical Forests Forever Facility (TFFF); e a urgência de definirmos um mapa com prazos concretos e metas claras para o fim do uso dos combustíveis fósseis.

Estar presente como representante da iniciativa privada — da indústria nacional e do setor da moda — nos coloca na vanguarda da agenda climática. As indústrias têxtil e de varejo têm um impacto relevante: estimativas globais apontam que o setor responde por uma parcela expressiva das emissões de gases de efeito estufa — alguns estudos reconhecem entre cerca de 4% a 8% das emissões globais.

Esse cenário nos confere um papel de liderança: temos capacidade de impulsionar a transição energética das nossas cadeias produtivas, tanto em energia elétrica quanto em energia térmica, o que é fundamental se quisermos contribuir para limitar o aquecimento global ao 1,5 °C definido no Acordo de Paris. Mas a transição precisa ser justa: a crise climática também é uma crise de desigualdade.

O consumo per capita de moda é muito maior em países desenvolvidos, enquanto a produção, maior parte da cadeia têxtil, está concentrada em países em desenvolvimento, que frequentemente são os mais vulneráveis aos impactos climáticos. Por isso, é essencial que falemos sobre financiamento justo. Sem ele, não há transição justa.

Na COP30, embora a presença de grandes marcas internacionais tenha sido tímida, entidades e associações de classe do setor estiveram ativas e fizeram pronunciamentos públicos.

O Fashion Industry Charter for Climate Action, braço da UNFCCC para o setor da moda, publicou um comunicado com três exigências claras para governos e empresas: acesso acelerado à energia renovável; divulgação obrigatória de metas e planos climáticos corporativos; e financiamento para descarbonizar cadeias produtivas, primordial para o avanço do setor.

A inserção da moda na conversa climática é indispensável. Mas não basta discursar: já ultrapassamos a fase da retórica. A COP30 foi — e deve continuar a ser — a COP da implementação. A hora de acelerar é agora.” – Taciana Abreu, diretora de Sustentabilidade da Riachuelo

GRUPO AZZAS 2154

Foto: Jéssica Nicole Oliveira

“Discutir a agenda climática no coração da Amazônia trouxe uma profundidade às conversas da COP30. Estar nesse território permitiu uma conexão direta com a floresta e com os povos que fazem parte dela (comunidades indígenas, ribeirinhas, lideranças femininas e juventudes do Norte do Brasil), além de possibilitar trocas e diálogos sobre sociobioeconomia a partir de onde ela efetivamente ocorre.

Para nós, do Azzas 2154, participar da conferência foi também uma forma de reforçar o papel da moda brasileira na transição climática. Estivemos presentes em diferentes espaços do evento, dialogando com atores do nosso setor e de cadeias correlatas sobre temas como descarbonização, rastreabilidade de produtos e transparência na produção desde as fazendas de cria até as lojas. Parte dessa agenda aconteceu em parceria com o Sistema B, incluindo encontros como o realizado na Ilha do Combu, que reuniu empresas e parceiros para discutir caminhos concretos rumo a um futuro regenerativo para a moda.

Ao longo da COP30, essas trocas deixaram evidentes que avanços estruturais na indústria da moda dependem de colaboração, alinhamento e ação conjunta entre diferentes atores do setor, em uma agenda que é, necessariamente, coletiva.” – Suelen Joner, head de Sustentabilidade do Grupo Azzas 2154

LOJAS RENNER

“A COP30 reforçou o posicionamento da moda em comunicar sobre sustentabilidade, que deixou de ser um assunto periférico e se tornou parte das discussões de clima, transição justa, adaptação e consumo responsável. A moda se conecta diretamente com o cotidiano das pessoas e com decisões que acontecem todos os dias, escolhas de compra, uso, cuidado e descarte. Na COP30, ficou claro que discutir sobre clima passa também por aproximar o tema das pessoas, e a moda tem capacidade única de traduzir sustentabilidade em linguagem acessível e tangível, como a forte participação da sociedade civil na Green Zone.

Para nós, foi importante ver como temas que trabalhamos internamente há anos, como circularidade, matérias-primas responsáveis, descarbonização da cadeia e adaptação climática, hoje são pautas maduras dentro do debate global.

A Lojas Renner S.A. vem apresentando sua jornada climática na Blue Zone da COP desde 2023, com trajetória consistente e com projetos concretos, métricas, dados e experiências reais de transição, o que fortalece a credibilidade das discussões e amplia o impacto das soluções apresentadas. Na COP30, reforçou o papel como referência em moda responsável e regenerativa. Durante o evento, apresentamos iniciativas pioneiras que unem sustentabilidade, inovação e impacto social positivo. Entre elas estão:

•⁠ Projeto “Florestas de Algodão”: em parceria com a startup Farfarm e a Universidade Federal de Mato Grosso, a Lojas Renner S.A. lançou um modelo agroflorestal que integra o cultivo de algodão com espécies nativas e frutíferas. A iniciativa promove regeneração ambiental, inclusão social e geração de renda para agricultores familiares, além de sequestrar carbono e aumentar a biodiversidade.

•⁠ Coleção com algodão agroflorestal: pouco antes da COP30, a empresa apresentou sua primeira coleção desenvolvida com algodão proveniente desse sistema inovador, reforçando o compromisso com matérias-primas de baixo impacto e práticas circulares.

•⁠ Projeto circular: outra iniciativa da Lojas Renner S.A. foi o apoio ao Projeto Circular Campina Cidade Velha, uma premiada iniciativa cultural e comunitária que integra memória, sustentabilidade e ocupação criativa do centro histórico de Belém do Pará. Esta temporada do projeto foi inaugurada em outubro com a realização do Circuito Cultural, do Fórum Circular e posterior lançamento de uma edição histórica da Revista Circular —, ações que, neste ano, dialogaram com os temas debatidos na COP30. A varejista também levou ao Circuito o Ecoponto, espaço de conscientização instalado durante a programação, no qual o público poderia doar roupas em desuso. As peças serão higienizadas e destinadas ao coletivo Mulheres Por Elas, que apoia mulheres em situação de vulnerabilidade.

Metas climáticas ambiciosas: a Lojas Renner S.A. reafirmou seus compromissos no evento: reduzir em 55% as emissões por peça até 2030 e alcançar a neutralidade climática até 2050, metas validadas pela Science Based Targets initiative (SBTi).

Economia regenerativa como estratégia: as ações sustentáveis da companhia já geram resultados financeiros positivos, comprovando que é possível aliar impacto socioambiental e geração de valor para o negócio. Com essas iniciativas, a companhia reforça sua visão de futuro: uma moda que respeita o planeta, valoriza as pessoas e contribui para um mundo mais sustentável.”– Eduardo Ferlauto, diretor de Sustentabilidade da Lojas Renner S.A.

GRUPO LUNELLI

Foto: Divulgação

“A realização da COP30 no coração da Amazônia tem um simbolismo importante, é um chamado global para que se reconheça a relevância desse bioma na regulação climática do planeta. Estar presente nesse espaço é reconhecer que as soluções climáticas precisam envolver, desde já, os principais ecossistemas ameaçados e as populações que neles vivem.

Já participamos da COP28 (Dubai), COP29 (Azerbaijão) e agora a COP30 (Brasil). Pelo terceiro ano consecutivo, fomos convidados a participar da COP, na qual apresentamos ao público internacional nossas iniciativas e projetos relacionados ao EESG. O convite para a participação é um reflexo do contínuo compromisso da Lunelli com a sustentabilidade e da implementação de ações práticas para fazer moda com significado. Ao longo de cinco dias, participamos de debates na Blue Zone e em espaços parceiros, abordando temas como economia circular, rastreabilidade, governança e o avanço das Empresas B no Brasil e na América Latina.

A Lunelli entende que o setor da moda, sobretudo o têxtil, precisa estar presente nos debates climáticos globais. A cadeia têxtil, da fibra ao consumidor final, gera impactos relevantes, sejam no uso de recursos naturais como água e energia, sejam nas emissões, resíduos ou na geração de empregos. Por isso, acreditamos que a participação de uma grande empresa de moda nacional como a Lunelli em eventos como a COP reforça nosso compromisso com a moda com significado, pautada por responsabilidade ambiental, social e econômica, especialmente por sua relevância ao ocorrer no Brasil e pela oportunidade de integração com stakeholders da cadeia têxtil e de moda brasileira.” – Mariana Riskoski Emmerich, especialista em Sustentabilidade do Grupo Lunelli

A FLORESTA ENSINA

Com forte atuação e articulação para orientar empresas do setor de moda no caminho da sustentabilidade e circularidade, a Cora Design não poderia ficar de fora desse importantíssimo evento. Junto à Abit, Sistema B e outras conexões, suas representantes participaram ativamente dos debates e vivenciaram a experiência de estar no meio da Amazônia, vendo tudo acontecer.

“Foi uma vivência muito particular nossa”, destaca Laura Madalosso, que, com a Raquel Chamis, fundou a Cora Design. Ela conta que, antes da realização do evento, sentiu falta de mais informações sobre a programação oficial e a presença do setor da moda na COP30 e, chegando a Belém, viu que haveria ações paralelas acontecendo. Para Laura, foi mais um desafio de comunicação.

“Eram mais de 60 espaços de side events espalhados pela cidade, casarões antigos, casas à beira-rio, algumas estruturas montadas só para o evento, além do espaço principal, onde ficava a programação oficial. A sociedade civil abraçou a COP30, foi impactante e energizante, pois em nenhuma outra COP tivemos uma participação tão ampla da sociedade, estava bonito de ver. E o nosso setor com diálogos tão importantes e transversais, como inovação em materiais, bioeconomia, mitigação de emissões de carbono, desmatamento, da transição para a economia circular, a Agrizone falando do algodão, a escuta aos povos originários, resgate de saberes, de culturas. Foi muito legal ver a moda participando de todos esses espaços, gerando debates, mostrando sua visão sistêmica”, relata Laura.

Camila Zelezoglo, da Abit, também nos passa o que mais a tocou em termos de aprendizados na COP30: a colaboração. “Sem dúvida, saímos fortalecidos com a importância da colaboração, da troca, do diálogo, porque pela complexidade da agenda, individualmente, acho que as empresas entenderam que há limitações nos próximos passos, quanto a metas ambiciosas. Assim, a atuação estruturante coletiva será fundamental para darmos passos mais largos e estar nessas conversas. Vivenciar isso em um ambiente tão fértil e rico de troca de informações potencializa um pouco dessa ambição de fazermos as coisas conjuntamente, dissipando menos energia e sendo mais efetivo e eficiente naquilo que a gente quer avançar no setor.”

Para Suelen Joner, do AZZAS 2154, a COP30 reforçou para nós a potência criativa e cultural do Brasil como um ativo estratégico para a transformação da moda. “Além das trocas realizadas nos diferentes fóruns do evento, trouxemos na bagagem a riqueza cultural do Pará como um legado simbólico e inspiracional. Nesse sentido, após a conferência, compartilhamos insights, aprendizados e reflexões com nossos times do Azzas 2154, que vão desde inspirações para produtos e referências ligadas à sociobioeconomia até a importância de práticas responsáveis de comunicação e o cuidado com o allwashing. Esse movimento faz parte de um processo contínuo de amadurecimento interno”, reforça.

“Mais do que falar em ajustes imediatos e pontuais, o exercício tem sido o de ampliar repertório, fortalecer o senso crítico e alinhar visões internas sobre o papel do grupo na construção de uma indústria mais responsável, com ações progressivas e consistentes ao longo do tempo. Com isso, ficou ainda mais claro para nós que é fundamental sermos propositivos, construir pontes com diferentes atores e usar a escala e os ativos que temos para contribuir, de forma estruturada, com uma transformação real da indústria da moda.”

Já Taci Abreu, da Riachuelo, trouxe uma perspectiva diferente: a do consumo energético. “Um aprendizado essencial da COP30 que levamos para nossas operações é que o futuro climático da moda será decidido pela forma como lidamos com energia térmica, especialmente em fábricas onde há tingimento, estamparia, secagem, lavagem e branqueamento. Anotem: para oficinas de costura e confecções, a prioridade é a transição da energia elétrica para fontes renováveis; para cadeias com uso intenso de calor, a transição térmica é crítica”, alerta.

“Internamente, demos passos concretos na Riachuelo: nossa fábrica própria, que responde por aproximadamente 40% da nossa roupa, já é abastecida por energia renovável, e vamos substituir o combustível da nossa caldeira, saindo do gás natural (combustível fóssil) para a biomassa (insumo renovável). Queremos fomentar a cadeia da biomassa no estado do Rio Grande do Norte, onde fica nossa matriz, para que possamos ter o manejo sustentável atrelado à recuperação de solo degradado e combate à desertificação, gerando ainda mais benefícios sociais e ambientais para o projeto. Iniciamos também nossa transição energética – elétrica e térmica –, o que é fundamental para descarbonizar nossas emissões diretas (Escopos 1 e 2). O grande desafio – e nossa prioridade a seguir – é estender essa transição ao longo de toda a cadeia de fornecimento, ou seja, ao Escopo 3, que concentra a maior parte das emissões ligadas à moda. Para isso, precisamos de colaboração entre varejistas e fornecedores, com o propósito comum: eliminar o uso de combustíveis fósseis”, conclama.

Eduardo Ferlauto, da Lojas Renner, também avalia o papel da moda brasileira dentro da agenda climática global a partir desta edição. “Saímos da COP30 com a convicção de que a moda brasileira tem um papel relevante na agenda climática global. A partir desta edição, sentimos que o setor passa a ser reconhecido não apenas pelos desafios, mas pelo potencial de inovação, escala e impacto positivo. Para nós, como empresa, a COP30 reforçou algo que já vivenciamos no dia a dia: quando aproximamos sustentabilidade do consumidor, dos fornecedores, de diálogos com o setor público e demais players, criamos caminhos concretos para acelerar a transição climática. A partir desta edição, vemos o Brasil contribuindo mais ativamente com referências, modelos e aprendizados que podem inspirar outros mercados.”

MATÉRIAS-PRIMAS E CULTURA RAIZ

Estando num ambiente tão fértil e inspirador – em cores, sabores, vivências, flora e fauna – , impossível não sair da região amazônica com uma nova bagagem cultural e de conhecimentos, especialmente os vindos dos povos originários, como novos materiais possíveis e novas formas de trabalhá-los.

Camila Zelezoglo, da Abit, relembra que, há muitos anos, são feitos alguns cultivos voltados à indústria têxtil naquela região, como, por exemplo, os de juta e malva, feitos pelos ribeirinhos, além da borracha, sementes e o couro do pirarucu, de forma controlada, e há outros movimentos acontecendo, ligados à bioeconomia, com a presença do IPT e do SENAI.

“Acho que trazem um ponto de atenção em como alguns saberes que estão relacionados a plantas, a sementes daquela região têm uma grande potencialidade de serem estudadas, aprofundadas em termos de transformação para a nossa cadeia, com verdadeiros atributos de sustentabilidade. Há também a pauta de inovação ligada à bioeconomia, que tem saberes daquela região que serão muito importantes para novos desenvolvimentos em termos de fibras e de bioinsumos como corantes naturais, entre outras questões”, destaca.

Cultivo de malva e juta na região amazônica / Fotos: Paulo Almeida Filho / Associação Comercial do Amazonas

“A COP30 reforçou para nós a potência criativa e cultural do Brasil como um ativo estratégico para a transformação da moda. Além das trocas realizadas nos diferentes fóruns do evento, trouxemos na bagagem a riqueza cultural do Pará como um legado simbólico e inspiracional”, comenta Suelen, do AZZAS 2154.

“Nesse sentido, após a conferência, compartilhamos insights, aprendizados e reflexões com nossos times do Azzas 2154, que vão desde inspirações para produtos e referências ligadas à sociobioeconomia até a importância de práticas responsáveis de comunicação e o cuidado com o allwashing. Esse movimento faz parte de um processo contínuo de amadurecimento interno”, completa.

Segundo a head de sustentabilidade do AZZAS, mais do que falar em ajustes imediatos e pontuais, o exercício tem sido o de ampliar repertório, fortalecer o senso crítico e alinhar visões internas sobre o papel do grupo na construção de uma indústria mais responsável, com ações progressivas e consistentes ao longo do tempo.

“Com isso, ficou ainda mais claro para nós que é fundamental sermos propositivos, construir pontes com diferentes atores e usar a escala e os ativos que temos para contribuir, de forma estruturada, com uma transformação real da indústria da moda.”

Taciana Abreu, da Riachuelo, lembra que uma parte importante da descarbonização do Escopo 3 do GHG Protocol – ou seja, das emissões indiretas de gases de efeito estufa -, está no uso de matérias-primas com pegada de carbono reduzida e, ainda, que o uso de energia renovável resolve uma parte da equqção, mas a outra virá de insumos mais limpos.

“Na COP30, nos inspiramos em marcas e iniciativas que investem em matérias-primas de base natural e sustentável — como o uso de látex vegetal pelas marcas Da Tribu e Bossa Pack, biojoias feitas de sementes como as da Nunghara, Eco Arte e Together Band, com a qual fizemos parceria e cujos produtos estão disponíveis no nosso site. Por isso, para nós, fibras naturais e de base biológica, assim como aviamentos e tingimentos de base natural, têm papel fundamental na criação de uma moda regenerativa. A bioeconomia, assim como a economia circular, se revelam vias estratégicas de transição. Fomentar estes materiais, “vestir a Amazônia”, é também pensar em moda pró-clima”, declara Taciana.

ASSOBIO E RIACHUELO PROMOVEM DESFILE-MANIFESTO “VESTIR AMAZÔNIA, REFLORESTAR O CLIMA”DURANTE A COP30

Foto: a2ateliê

No dia 13 de novembro, a Associação de Negócios da Sociobioeconomia da Amazônia (Assobio) realizou o evento “Vestir Amazônia, reflorestar o clima”, um levante criativo, político e sensorial em plena Ilha do Combu, como parte das ativações paralelas da COP30.

Idealizado pelo Grupo de Trabalho de Moda e Beleza da Assobio, com direção criativa do designer indígena Sioduhi, e apoio da Riachuelo, o evento reuniu dois painéis temáticos e um desfile-manifesto inédito. Juntas, as atividades propuseram reflexões e novos imaginários sobre o futuro da moda feita com e pela floresta.

Mais que uma apresentação de coleções, o desfile – “Manifesto da Assobio pelo bem-viver” –, com direção criativa do Instituto Brasil Eco Fashion, foi uma encenação simbólica, sensorial e política. Foram apresentados 25 looks de 15 marcas associadas à Assobio e marcas convidadas (Igara Cestas, Seiva Amazon Design, Urucuna, Labb4, Nunghara Biojoias, Verobio, Bossapack, Yanciâ, Da Tribu, Tucum Brasil), exaltando os saberes tradicionais, inovações biomateriais e práticas regenerativas da floresta. A trilha sonora foi conduzida ao vivo pela cantora Djuena Tikuna, com a presença de mestres da floresta em um dabucuri coletivo – ritual de celebração, troca e união ancestral.

“Vestir a Amazônia é propor outra moda possível que refloreste os corpos, os territórios e a imaginação. A floresta é fonte de beleza, saber, tecnologia, cuidado e design. Este desfile é um ato de futuro”, afirma Tainah Fagundes, empreendedora da Da Tribu e conselheira da Assobio, uma das lideranças do evento.

Os looks apresentados integram peças das marcas amazônicas com colaborações especiais da Riachuelo e Veja Shoes, além da presença de criadores referência em sustentabilidade no Brasil, como Day Molina (RJ), Flavia Aranha (SP), Catarina Mina (CE) e o próprio Sioduhi (AM).

“A Assobio tem como missão fortalecer os ecossistemas da sociobioeconomia amazônica e isso inclui, com muita relevância, os setores da moda, artesanato e beleza. Hoje, cerca de 30% dos negócios associados atuam nessas cadeias e têm um papel essencial na regeneração econômica, cultural e ambiental da região”, destaca Paulo Reis, presidente da Assobio.

Com um território simbólico e pulsante como o Combu, o evento conectou moda, bem-viver e justiça climática, ampliando vozes e saberes locais com alcance global.

C&A AVANÇA BA AGENDA CLIMÁTICA E ADERE AO MOVIMENTO CONEXÃO CIRCULAR DO PACTO GLOBAL DA ONU

Durante a COP30, a C&A Brasil anunciou sua adesão ao Movimento Conexão Circular, iniciativa do Pacto Global da ONU – Rede Brasil que incentiva empresas a acelerar a transição para uma economia circular e de baixo carbono. A companhia é a primeira varejista de moda a integrar o movimento, reforçando sua posição de liderança em sustentabilidade no setor.

A entrada da C&A no movimento representa o aprofundamento da agenda de circularidade, uma das principais da companhia. Com a adesão formal ao Movimento Conexão Circular, a C&A também se torna uma das embaixadoras do Movimento e reforça seu objetivo de integrar a circularidade ao modelo de negócios e inspirar o setor a repensar o ciclo de vida da moda, do design ao pós-consumo. Pelo compromisso firmado, a C&A ampliará o uso de matérias-primas recicladas e regenerativas; fortalecerá a logística reversa e a remanufatura de produtos; e expandirá o design de peças com princípios de circularidade, priorizando durabilidade, reúso e reciclabilidade. O engajamento da rede de fornecedores será intensificado, com foco em inovação, rastreabilidade e escalabilidade.

Cyntia Kasai, gerente sênior de comunicação e ASG da C&A, participa da cerimônia de assinatura do Movimento Conexão Circular. / Divulgação

Essas iniciativas se somam a metas já públicas da companhia como atingir 50% dos produtos com atributos de circularidade até 2030, meta que já alcança 34% de avanço, chegar a 80% de matérias-primas mais sustentáveis e reduzir em 42% as emissões absolutas de gases de efeito estufa no mesmo período, compromisso validado pela Science Based Targets initiative (SBTi).

“Essa adesão demonstra a liderança e a seriedade necessárias em um segmento onde direitos humanos e condições de trabalho são, inegavelmente, pilares da atuação ESG. Este é um sinal potente para o mercado. Em um segmento como o da moda, a circularidade não é apenas questão ambiental, mas também vetor para cadeias de valor mais éticas, transparentes e justas. No Pacto Global, por meio do nosso Grupo de Trabalho de Moda e Têxtil, buscamos de forma coletiva e colaborativa fortalecer as políticas e as boas práticas em toda a cadeia produtiva. Essa adesão é um passo essencial para a promoção e a efetivação de todos esses direitos, construindo um futuro mais justo, regenerativo e sustentável para a indústria de moda brasileira”, explica Monica Gregori, diretora de Impacto do Pacto Global da ONU – Rede Brasil.

O QUE A COP30 SIGNIFICA PARA A MODA, SEGUNDO A GLOBAL FASHION AGENDA

A carta aberta da Fashion Charter, publicada antes da COP30, enviou um sinal claro da intenção da indústria. Reafirmou o compromisso dos signatários com uma trajetória de 1,5 °C e destacou a necessidade de acelerar a energia renovável, eliminar gradualmente o carvão nas operações e instalações dos fornecedores e fortalecer a transparência na divulgação de informações. A carta também pediu um apoio político mais robusto nas principais regiões fornecedoras, incluindo a modernização das redes elétricas e a remoção de barreiras à aquisição de energia renovável, bem como a expansão do financiamento climático para fabricantes que enfrentam acesso limitado ao capital. Além disso, a carta enfatizou a importância do planejamento de adaptação à medida que os riscos climáticos se intensificam. Em suma, ressaltou que a ambição agora deve ser acompanhada por ações concretas em toda a cadeia de valor.

Os principais sinais da COP30 para a moda incluíram:

  • O alinhamento com metas fundamentadas na ciência deve se traduzir em mudanças operacionais, e não apenas em ambições de marca.
  • A rastreabilidade está passando de voluntária para essencial, principalmente à medida que as jurisdições implementam legislação de due diligence.
  • A transição energética nos polos de produção continua sendo uma das maiores alavancas climáticas da moda, e o progresso ainda é muito lento.
  • O risco para a biodiversidade influenciará cada vez mais as decisões políticas e de investimento, exigindo uma integração mais profunda das métricas ambientais nas estratégias corporativas.
  • A circularidade continua a se transformar de conceito em agenda política, e as empresas devem antecipar uma maior atividade regulatória em torno de resíduos, design e responsabilidade estendida do produtor.

Para a Global Fashion Agenda, a principal conclusão de Belém é dupla: soluções transformadoras já existem, particularmente aquelas lideradas por povos indígenas, comunidades vulneráveis, cientistas e trabalhadores, e a distância entre o compromisso e a implementação ainda é o principal obstáculo desta década, e a moda tem uma oportunidade e uma responsabilidade únicas de ajudar a reduzir essa lacuna. Garantir cadeias de suprimentos transparentes, livres de desmatamento e conversão, fazer a transição para energias renováveis, investir em sistemas circulares, proteger os trabalhadores e apoiar abordagens baseadas em direitos para a terra e o clima não são ações periféricas, mas, sim, indispensáveis para garantir uma indústria resiliente e próspera. Segundo a equipe, a COP30 reforçou a urgência do trabalho feito pela GFA, e o impulso criado em Belém deve agora se traduzir em ações mais ousadas e integradas em toda a cadeia de valor da moda.