Iniciativas para reduzir, neutralizar e até mesmo zerar já estão sendo adotadas no Brasil
Mudanças climáticas: este é um assunto que não sairá da pauta mundial tão cedo, nem da nossa. Como parte de uma indústria tão importante, necessária e, infelizmente, ainda bastante poluente, os setores têxtil e de confecção têm sua parcela a ser corrigida nesse cenário. Felizmente, importantes players do mercado global, incluindo o brasileiro, já assumiram essa tarefa e estão colocando em prática iniciativas que reduzem, neutralizam ou mesmo zeram suas emissões de gases de efeito estufa (GEE), especialmente o carbono (CO2). No entanto, ainda há muito a ser feito e, logicamente, não é em um passe de mágica, ainda mais em uma cadeia produtiva tão complexa e cheia de elos.
No Acordo de Paris, implementado em 2015 para que fossem mitigadas as mudanças climáticas – incluindo financiamentos a países mais pobres, que pouco emitem GEEs, mas sofrem com seus efeitos –, foi definido, em âmbito global, que até 2030 a temperatura na Terra não poderia aumentar mais do que 1,5°C. Para tanto, as emissões de carbono, em particular, precisariam ser reduzidas, adotando novas formas de produção industrial, consumo e matrizes energéticas, que não combustíveis fósseis e carvão. Caso contrário, todas as catástrofes que já estamos vivendo se ampliarão e, pior, de forma irreversível.
Em publicação do Intergovernamental Panel on Climate Change (IPCC), há a afirmação de que as atividades humanas, principalmente por meio das emissões de gases de efeito estufa, causaram inequivocamente o aquecimento global, com a temperatura da superfície atingindo 1,1 °C superior no período de 2011-2020. Emitir GEEs é algo completamente normal e inerente à vida na Terra, pois o “efeito estufa” saudável, no qual os raios solares não se dissipam tão rapidamente, mantém o planeta aquecido. Mas até a segunda página, quando se iniciou a era industrial, de aumento de população global e renda – consequentemente o consumo, seja de alimentos, roupas, máquinas de lavar, geladeiras, seja de viagens aéreas –, as emissões desses gases foram a patamares estratosféricos, com o perdão do trocadilho. O importante era produzir, vender, ter, tudo de forma hiperbólica.
Ainda segundo o IPCC, as emissões líquidas acumuladas históricas de CO2 de 1850 a 2019 foram na casa das 240 gigatoneladas, das quais mais da metade (58%) ocorreu entre 1850 e 1989, e cerca de 42% entre 1990 e 2019.
Só que, em 2019, as concentrações atmosféricas de CO2 (410 partes por milhão) foram maiores do que em qualquer época em pelo menos 2 milhões de anos (aproximadamente 79% das emissões de GEE vieram dos setores de energia, indústria, transporte e edifícios juntos, e 22% da agricultura, silvicultura e outros usos da terra), e as concentrações de metano (1.866 partes por bilhão) e óxido nitroso (332 partes por bilhão) foram maiores do que em qualquer momento em pelo menos 800.000 anos.
Com a guerra na Ucrânia e o desabastecimento de gás natural na Europa, os combustíveis mais poluentes, como o carvão, voltaram à ativa, principalmente para o aquecimento da população no inverno, minando a meta de não ultrapassar o 1,5 °C – agora se fala em 2 °C. Sabe a expressão: “Como se não houvesse amanhã”? Pois a humanidade agiu direitinho para que isso se tornasse o mais próximo possível da realidade.
A INDÚSTRIA DA MODA NESTE CONTEXTO
Segundo o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Unep), a cada ano o setor têxtil emite de 2% a 8% dos gases de efeito estufa do mundo, considerando o volume da produção de roupas, que praticamente dobrou nos primeiros 15 anos deste século, ao passo que se reduziu em 36% o número de vezes que uma roupa é usada antes de ser descartada. Os resultados podem ser conferidos no cemitério de roupas do Deserto do Atacama, já visto até de fora do planeta Terra, como falamos na edição 132 da Costura Perfeita, ou mesmo nas ruas ou aterros sanitários mais próximos de casa.
De acordo com a Global Fashion Agenda, mais de 70% das emissões de carbono na indústria da moda provêm de atividades upstream, ou seja, matéria-prima particularmente intensiva em energia, produção, preparo e processamento, e os outros 30% provêm das atividades downstream, como transporte, embalagem, operações de varejo, uso e fim de uso. Vale lembrar que o excesso de lavagens de roupas em máquinas domésticas também não ajuda em nada quando o assunto é meio ambiente, exigindo maior uso de água, eletricidade, emissões de GEE e microplásticos.
No caso industrial, produção sob demanda e mais próxima do consumidor, maior eficiência nos processos produtivos das fiações, tecelagens e malharias, uso de energia renovável e limpa em toda a cadeia de valor e substituição de processos úmidos para a seco se somam a outras diversas medidas para a redução da pegada de carbono, ou seja, a quantidade de GEE emitida direta ou indiretamente. Mas esses esforços concentrados e conjuntos têm que ser feitos já.
EXEMPLOS “DENTRO DE CASA”
Como dito anteriormente, importantes players do mercado global já assumiram a tarefa de reduzir, neutralizar ou mesmo zerar suas emissões de gases de efeito estufa (GEE), em especial o carbono (CO2). Conheça, a seguir, alguns bons exemplos aqui do Brasil.
PANTYS
Primeira marca de calcinha absorvente do país, a Pantys também foi a primeira na moda brasileira a adotar a etiqueta carbono neutro em suas peças. Com o posicionamento “marcas do futuro são carbono neutro”, a Pantys acredita que a etiqueta de carbono neutro se tornará um hábito, assim como olhar a tabela nutricional nas embalagens dos alimentos, além de ser uma forma de trazer mais transparência às consumidoras e iniciar um movimento no mercado de moda nacional, considerado um dos segmentos que mais geram poluição ambiental, com o intuito de medir, reduzir e compensar as emissões de gases de efeito estufa gerados na cadeia produtiva.
Para que fosse possível aplicar as etiquetas nas peças da Pantys, o estudo foi realizado em parceria com a equipe da WayCarbon. O estudo de análise de ciclo de vida focado nas emissões de gases de efeito estufa, que vão desde a extração das matérias-primas até a sua disposição final: materiais, produção, transporte, embalagem, uso e descarte de cada um dos modelos das calcinhas e sutiãs absorventes, analisando todas as variáveis relevantes do processo de produção, além de todos os inputs e outputs de cada etapa.
“Nossa intenção com essa iniciativa é realmente conscientizar e trazer acesso a essa informação para a linguagem dos consumidores, possibilitando que eles saibam como suas compras impactam no meio ambiente. Assim como o consumidor já é mais esclarecido para compreender uma tabela nutricional, o nosso objetivo é que no futuro ele tenha total discernimento e conhecimento para questionar as marcas em relação a emissão de CO2”, explica Emily Ewell, sócia-fundadora da Pantys.
MALWEE
Ao longo dos 55 anos de história, o Grupo Malwee sempre buscou adotar iniciativas que visam minimizar os impactos de suas atividades. Renato Martins, gerente de Projetos ESG e Comunicação Institucional do Grupo Malwee conta que a empresa foi uma das primeiras varejistas a implementar um Relatório de Impacto e a estabelecer metas de redução de emissões de GEE conforme as diretrizes do SBTi (Science Base Targets Initiative) Net Zero, e desde 2019 também calculam a pegada de carbono, entre outras ações.
“Além das iniciativas internas, sempre incentivamos e buscamos que nossa cadeia de fornecimento esteja alinhada aos nossos compromissos ambientais e sociais. Acreditamos que ser sustentável sozinho não é suficiente. No entanto, não podemos afirmar que nossas medidas tenham servido de exemplo, mas atuamos com o propósito de inspirar a mudança. Nosso objetivo é mostrar que é possível criar uma moda ética e sustentável, que seja benéfica para o planeta e para as pessoas”, reforça.
Atualmente, o Grupo Malwee utiliza energia elétrica renovável (eólica) em 100% de suas operações fabris, incluindo a matriz e a malharia em Jaraguá do Sul (SC), e a unidade de Pacajus (CE). Essa energia é adquirida por meio do mercado livre, com rastreamento da fonte geradora.
“A adoção dessa modalidade de energia ocorreu após uma análise de nossos indicadores e metas ambientais, que estão detalhadas em nosso Plano ESG 2030. Nossa meta é reduzir em 50% as emissões de gases de efeito estufa dos escopos 1 e 2 em relação a 2019. Em 2022, já conseguimos uma redução de 22% em comparação a 2021, graças ao uso dessa energia limpa. A eficiência produtiva e econômica ainda está sendo calculada, e estamos convertendo novas máquinas para fontes de energia limpa. O projeto ainda está em andamento”, conta Renato.
Para ele, hoje em dia muitas empresas afirmam ser ‘carbono zero’, mas, em sua opinião, simplesmente compensar as emissões no final do ano não resolve o problema.
“Se todas as empresas apenas pagarem pela compensação sem reduzir suas emissões, a poluição continua do mesmo jeito. No Grupo Malwee, calculamos nossa pegada de carbono desde 2018, utilizando a metodologia do ACV (Análise do Ciclo de Vida) desde a produção até a entrega do produto. Para estabelecer metas em parceria com o SBTi, usamos como referência o ano de 2019 e aprimoramos os dados incluindo informações além das fronteiras da empresa, como transporte e franquias. Nosso inventário foi elaborado seguindo as normas, as diretrizes e as recomendações do Protocolo de Gases de Efeito Estufa, adotando os valores de referência do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas AR5 (IPCC, 2013), obtidos por meio da base de dados do ciclo de vida, o Ecoinvent.”
O gerente de Projetos ESG do Grupo Malwee afirma que essa análise é importante porque, de acordo com as regras para definição de metas do SBTi, as empresas que possuem mais de 40% de suas emissões provenientes do escopo 3 devem estabelecer metas de redução considerando pelo menos 2/3 das emissões desse escopo. A meta do escopo 3 abrange a categoria 1 da metodologia GHG, que inclui produtos e serviços adquiridos, responsáveis por mais de 67% das emissões do escopo 3. Isso engloba matérias-primas diretas, serviços diretos, como costura terceirizada, e materiais de consumo indireto e outros itens adquiridos.
“Dada a complexidade do tema e a incerteza dos métodos, há muito trabalho a ser feito em termos de base. Nas estratégias estabelecidas para reduzir as emissões do escopo 3, definimos como próximos passos: desenvolver um plano de ação considerando as melhores tecnologias disponíveis no mercado internacional para processos têxteis; listar as tecnologias de produtos químicos com menor impacto para a indústria têxtil; estudar os impactos de produzir internamente versus terceirizar os processos; realizar um estudo avançado sobre as emissões de gases de efeito estufa, utilizando a abordagem de Avaliação do Ciclo de Vida, da cadeia de valor do algodão no Brasil, comparando algodão convencional, BCI, reciclado e orgânico; estabelecer políticas internas e projetos que priorizem matérias-primas de menor impacto; e promover a inovação na busca de alternativas para os fios convencionais.”
RENNER
A Lojas Renner S.A. tem uma estratégia de sustentabilidade sólida e ampla, buscando ser agente de transformação no setor varejista. Nesse sentido, a empresa possui estratégias de gestão dedicadas ao monitoramento e ao desenvolvimento socioambiental da sua rede de fornecimento, visando diminuir o impacto ambiental e melhorar seu desempenho.
Desde 2016, a Renner compensa 100% dos gases de efeito estufa (GEE) emitidos em suas operações por meio do investimento na restauração de mais de 186 mil hectares de florestas, mas destaca que seu objetivo é fazer a transição para a descarbonização dos negócios da Lojas Renner S.A. com métricas baseadas na ciência, a fim de criar as condições de levá-la à neutralidade climática (Net Zero) em 2050 e, para isso, o uso de energia limpa é imprescindível.
Atualmente, 100% do consumo corporativo de energia da Lojas Renner S.A. (lojas, centros de distribuição e sede administrativa) já é proveniente de fontes renováveis de baixo impacto, o que inclui energia solar, eólica e originada de pequenas centrais hidrelétricas. A companhia não tem
fábrica própria e conta com uma rede de fornecimento responsável da Enel, com quem firmou em 2021 contrato para compra de energia eólica que, hoje, abastece 100% da demanda de 170 lojas e de seu novo Centro de Distribuição.
RIACHUELO
A produção da Riachuelo conta hoje com 100% do uso de energia renovável, o que faz parte da sua estratégia de redução das emissões de gases de efeito estufa. Valesca Magalhães, diretora de Sustentabilidade e Comunicação Interna da Riachuelo, conta que estão estudando na empresa outras formas de implementação de energia limpa, reforçando seu compromisso com o meio ambiente de não apenas reduzir as emissões dos gases, mas também de regenerar os ecossistemas.
“No ano passado firmamos uma parceria com a Saving the Amazon, que trabalha no diálogo, divulgação de informações e participação ativa para empoderar as pessoas no combate à crise climática, possibilitando o plantio de mais de 10 mil árvores na grande reserva indígena de Tukuna Umariaçu, cumprindo a captura de carbono e impactando na redução de emissão de gases de efeito estufa, principalmente o dióxido de carbono. Outra importante iniciativa pela causa foi a parceria com a iniciativa global Take Care with Peanuts, que aborda temas de conscientização para a preservação do meio ambiente em tirinhas e frases dos personagens do Snoopy, e atua em conjunto com a Fundação SOS Mata Atlântica, que pretende, em até cinco anos, plantar 75 mil árvores; 10% desse total será alcançado com nosso apoio”, conta Valesca.
Para a diretora de Sustentabilidade da Riachuelo, a adoção de matrizes de energia limpa e renovável deve ser uma prática a dominar a indústria daqui em diante, o que também ajuda na redução de emissão de GEE.
“Essa é uma frente que vem ganhando muita força nos últimos tempos e ver empresas se adaptando para implementá-las na operação nos leva a crer que esse será o futuro do setor varejista no país. As marcas e as operações estão percebendo o real impacto que as fontes de energia comum trazem para o ambiente, como a emissão de GEE que impacta negativamente o aquecimento global e as mudanças climáticas. Como responsáveis por grande parte do uso de energia, essas marcas estão se policiando cada vez mais como forma de conscientização para outras empresas e até para seus colaboradores e consumidores”, avalia.
RUN MORE
Há 27 anos no mercado de moda esportiva e beachwear feminina, a Run More, sediada em Estrela (RS), que hoje tem uma produção média de 40 mil peças por mês, e planeja aumentar 20% em 2023, está presente em onze estados brasileiros e em 14 países, como Chile, Paraguai, Japão, Itália, Uruguai, Costa do Marfim, Bolívia, EUA, Holanda, Espanha, Austrália, Nova Zelândia, Equador e Grécia.
Ana Dullius, diretora de Comunicação e Marketing da Run More, conta que, em 2016, a planta fabril na matriz foi ampliada para a construção de um segundo prédio, que já teve seu telhado projetado com a inclinação ideal para a instalação de placas solares, o que aconteceu em julho de 2019. A instalação de 690 módulos fotovoltaicos tornou a Run More autossuficiente na geração de energia em sua fábrica, o que a fez ter uma economia de 54% em relação à matriz antiga e deixar de emitir 257 toneladas de dióxido de carbono por ano. Para Ana, essa foi a realização de um sonho: produzir moda com energia limpa. “Até o presente mês, maio de 2023, deixamos de emitir 976 toneladas de CO2, o equivalente aos gases de efeito estufa que 215 carros emitem ao longo de 1 ano”, comemora.
Atualmente, cerca de 60% da energia da Run More tem origem na usina fotovoltaica, e o payback de sua instalação está dentro da expectativa de cinco anos e meio. O sistema escolhido pela empresa foi o Smart Flower Sollar, um seguidor solar com funcionamento similar ao de um girassol, que se abre durante o dia para seguir o sol e se fecha durante a noite. Ana explica que esse funcionamento garante a melhor posição para captação de energia.
“Essa foi a primeira Smart Flower Sollar a produzir energia na América Latina. Instalada no jardim da empresa, também é uma forma de disseminar a cultura do cuidado com o meio ambiente para a comunidade e indústrias da região”, ressalta.
Em 2022, a Run More iniciou a elaboração do seu Sistema de Gestão Ambiental, com a consultoria do polo de sustentabilidade do Senai no Rio Grande do Sul. “Além de objetivar a Certificação da ISO 14.001, referente à sustentabilidade, entendemos a importância da gestão dos dados de sustentabilidade e estamos evoluindo nesse sentido com a orientação da instituição”, completa a diretora.
FIAÇÕES EMPENHADAS EM REDUZIR SUA PEGADA DE CARBONO
Em uma das partes em que a extração, a criação e a utilização de matérias-primas são mais pungentes na indústria têxtil, as fiações estão investindo pesado em reduzir suas pegadas de carbono e de GEE. O bom é que isso beneficia a cadeia de forma global.
Carlos Fernandes, diretor comercial da The LYCRA Company para a América do Sul, diz acreditar que existem 3 passos necessários para conseguir influenciar seus clientes a caminharem em direção a uma produção mais sustentável e reduzirem a pegada de carbono.
O primeiro, segundo ele, é educação, compartilhando informações, recomendações e propostas que clarificam a importância e a necessidade de seguir cada vez mais no sentido de uma produção mais sustentável. O segundo é o exemplo. “Na The LYCRA Company contamos com o Planet Agenda, um compromisso de metas claras que direcionam nossas ações e investimentos para alcançarmos excelência no que se refere à sustentabilidade em todas as etapas do processo produtivo”, destaca.
O último, e mais importante passo, para Carlos, é o acesso, ou seja, tornar acessível ao mercado aqueles produtos e soluções que efetivamente representam redução da pegada de carbono no produto final. “Nesse conceito, temos o LYCRA® EcoMade, fio produzido com 20% de matéria-prima reciclada pré-consumo, e o LYCRA® Xtra Life, que permite às peças terem uma durabilidade superior, entre outros exemplos. O próximo passo virá da parceira que efetivamos com a Qore®, que vai permitir a produção em larga escada do fio LYCRA® bioderivado, com até 70% de matéria-prima renovável em sua composição”, conta.
A matéria-prima em questão é a QIRA®, fibra feita de milho de campo ou dentado, que pode ser utilizada em uma ampla gama de aplicações, incluindo moda praia, jeanswear e fraldas, reduzindo a pegada de carbono de produção do fio LYCRA® em até 44%.
Daniel Franco, engenheiro de Processos da The LYCRA Company, ressalta que a companhia já tem um time global com foco em energia, com representantes de cada um dos seus sites ao redor do mundo, com um grupo que constantemente busca e discute iniciativas para buscar os BETs definidos no seu último relatório global de metas e objetivos para 2030, disponível no site da empresa (lycra.com). Na planta de Paulínia (SP), a empresa atua com um time de Sustentabilidade que, entre outras ações, busca otimizações nos processos que consomem o gás natural utilizado no processo produtivo e, com isso, emissões de efeito estufa provenientes da queima desse combustível. Daniel destaca ainda que o olhar também é constante para a confiabilidade dos equipamentos, como os de refrigeração, para que operem com maior robustez e mínima necessidade de intervenções.
A israelense NILIT é outra que vem revolucionando o mercado com seus fios de poliamida premium 6.6 da marca SENSIL®, feitos de forma e com componentes que elevam a sustentabilidade nas indústrias têxtil e de confecção. Um dos exemplos é o SENSIL® ByNature, primeira poliamida premium de base biológica, substituindo a matéria-prima fóssil pela Biomass Balance (BMB), produzida pela Basf.
“SENSIL® ByNature é uma inovação revolucionária em poliamida 6.6 premium, pois reduz significativamente a pegada de carbono, ao mesmo tempo que fornece fibra artificial da mais alta qualidade para vestuário. Cada tonelada desse fio representa a diminuição de 900 kg de emissão de carbono na atmosfera”, afirma Paulo De Biagi, diretor-presidente da NILIT para a América Latina.
Não podemos deixar de fora a austríaca Lenzing, que também não utiliza materiais fósseis e vem há tempos investindo em zerar suas emissões de carbono, e a mais nova integrante do mercado: a Woodspin, joint venture entre a finlandesa Spinnova e a brasileiríssima Suzano, que acabaram de inaugurar sua fábrica na Finlândia, a qual deve produzir 1.000 toneladas por ano de fibra têxtil sustentável, reciclável e totalmente biodegradável elaborada a partir da polpa de eucalipto, com zero emissão de carbono, segundo as empresas.
CARTILHA AO SETOR TÊXTIL BRASILEIRO
A Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecção (Abit) anunciou que está sendo produzida uma cartilha direcionada ao setor têxtil brasileiro explicando como reduzir sua pegada de carbono. O material está sendo preparado em parceria com a FGV e deve ser lançado no Congresso Internacional Abit 2023, ainda sem data definida.
COMPENSA OU NÃO COMPENSA?
Quando se fala em carbono e gases de efeito estufa, uma enxurrada de termos vem à tona: compensação de carbono, neutralização, créditos de carbono, descarbonização, Net Zero, carbono zero, entre outros, o que acaba confundindo e gerando informações equivocadas, como explica Janaína Dallan, CEO da Carbonext e uma das quatro brasileiras a fazer parte do quadro da ONU para projetos de mudanças climáticas.
“A desinformação ainda é um grande problema para medidas importantes que trazem grandes resultados. O mecanismo dos créditos de carbono exige aprimoramento e maior transparência, mas ataques desinformados não contribuem para o avanço que é realmente necessário. As medidas de compensação, quando sérias, auditadas, feitas com integridade e respeito às boas práticas internacionais, são instrumentos de grande valor para desarmar uma bomba relógio climática. Nesse momento, em que ainda não temos tecnologia suficiente para uma economia de baixo carbono, todas as ações são importantes para que consigamos ficar abaixo do limite de 1,5 °C de aumento na temperatura global. Não há solução imediata, e a compensação de carbono ainda é uma das melhores opções disponíveis”, comenta.
A Carbonext, no caso, possui um trabalho sólido de atuação na geração de créditos de carbono, revertidos em projetos de preservação da Floresta Amazônica. Segundo Janaína, a empresa é hoje a maior desenvolvedora de projetos nesse sentido no país.
“Os créditos são gerados por meio de parcerias com proprietários de terra para a implantação de projetos de preservação ambiental e desenvolvimento socioeconômico, que beneficiam não apenas a floresta e a biodiversidade que lá existe, mas também as populações tradicionais presentes nas comunidades locais”, explica.
Janaína também enfatiza que o futuro do planeta depende de decisões que precisamos tomar agora, e reduzir as emissões de gases de efeito estufa é uma medida crucial para impedir o aumento da temperatura global responsável pelas mudanças climáticas que ameaçam milhões de pessoas.
“Cada empresa ou pessoa física pode compensar suas emissões a partir do cálculo da sua pegada de carbono. A Carbonext, por exemplo, disponibiliza uma calculadora para esse objetivo. Ao conhecer a sua pegada de carbono, deve-se tomar ações para reduzi-la, e o restante pode ser compensado por meio da compra de créditos de carbono.”
Vale destacar que está em pauta no Ministério da Fazenda a regulamentação do mercado de carbono aqui no Brasil, que deve ser formalizada ainda em 2023.
COMO UMA ECONOMIA CIRCULAR REDUZ AS EMISSÕES DE GASES DE EFEITO ESTUFA
Ao adotar os princípios da economia circular e regenerativa para os produtos, serviços e sistemas que projetamos, podemos começar a reduzir os 45% restantes das emissões de GEE associadas à indústria, à agricultura e ao uso da terra – os quais apenas a transição energética (55%) não é capaz de resolver:
- Ao eliminar o desperdício e a poluição, reduzimos as emissões de gases de efeito estufa em toda a cadeia de valor.
- Ao circular produtos e materiais, retemos sua energia incorporada.
- Ao regenerar a natureza, sequestramos carbono no solo e nos produtos.
O QUE PODE AJUDAR
- A produção de material descarbonizado poderia reduzir as emissões anuais de GEE em 205 milhões de toneladas. Isso pressupõe cerca de 20% de melhorias na eficiência energética para a produção de poliéster, com base em melhorias tecnológicas nas máquinas, e uma redução de cerca de 40% no uso de fertilizantes e pesticidas no cultivo do algodão, devido a práticas agrícolas aprimoradas, como o espalhamento direcionado. Os fertilizantes são uma fonte significativa de emissões de GEE ligadas ao nitrogênio, enquanto os pesticidas emitem carbono durante a fabricação. Eles respondem por cerca de 70% das emissões de GEE no cultivo convencional de algodão.
- O processamento de material descarbonizado pode gerar 703 milhões de toneladas de economia de emissões de GEE por meio de energia renovável e melhorias de eficiência. Isso pressupõe um ganho de eficiência de 5% nas etapas de fiação, tecelagem e malharia, por exemplo, por meio de modificações no motor e na pressão do ar nas máquinas. Pressupõe uma mudança de processamento úmido para seco e adoção de tecnologias de processamento que consomem menos energia. Adicionalmente, a análise assume a utilização de energia 100% renovável nas fases de processamento, apoiada por marcas e varejistas.
- A produção minimizada e o desperdício de fabricação podem gerar 24 milhões de toneladas de economia de emissões de GEE. Isso pressupõe uma melhoria de 1 a 2 pontos percentuais nos resíduos gerados na transição da fibra para os têxteis e no corte de resíduos na fase de fabricação do vestuário por meio de um design sustentável e técnicas modernas de corte.
- A fabricação de roupas descarbonizadas pode gerar 90 milhões de toneladas de economia de emissões de GEE. Isso pressupõe uma melhoria de eficiência energética de 30% em equipamentos relacionados a aquecimento, ventilação e ar-condicionado e uma melhoria de eficiência de cerca de 20% em máquinas de costura por meio de novas tecnologias e atualizações de equipamentos. Adicionalmente, a análise assume a utilização de energia 100% renovável na fase de confecção do vestuário, apoiada por marcas e varejistas.
Fonte: Fashion on Climate – How the Fashion Industry can Urgently Act to Reduce its Greenhouse Gas Emission (Global Fashion Agenda e McKinsey).